Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Devoção a Nossa Senhora da Abadia começou em 1870

Edição nº 1688 - 16 de agosto de 2019

A devoção a Nossa Senhora da Abadia é originária de Portugal e bastante antiga. A imagem, que já era venerada desde o ano de 883 na Europa medieval, é procedente do Mosteiro de Bouro, situado no concelho de Amares, em Portugal, onde é também chamada Santa Maria de Bouro. Com a invasão dos mouros (mulçumanos árabes), os monges abandonaram o Mosteiro e, para evitar a profanação da imagem da Virgem Santíssima, esconderam-na numa gruta, ali permanecendo até o ano de 1.107, quando foi encontrada por ermitãos (Indivíduos que, através de penitência, habitam lugares despovoados e/ou isolados).

A devoção a Nossa Senhora da Abadia foi trazida ao Brasil pelos portugueses, para a diocese de Alagoinhas, em Jandira (BA), de onde foi se espalhando. Da Bahia para Goiás fixando-se no povoado de Muquém (GO) e, dali para o povoado de Água Suja (MG), área de mineração e garimpo, no Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, de onde ela é a padroeira. E desde aquele tempo começaram as peregrinações de romeiros, a pé, carros de bois, a cavalo...

O povoado de Água Suja (Romaria) surgiu no final do século XIX, com a descoberta de ouro e diamante no rio Bagagem, com o nome de Distrito de Nossa Senhora da Água Suja, que vigorou  até 1938, quando passou a se chamar Romaria (através do decreto-lei estadual nº 148, de 17-12-1938 ).  

Diz a história que, em 1867, os homens estavam sendo convocados para o serviço militar do Exército Brasileiro, para a guerra com Paraguai (1864/1870). Fugindo dessa convocação, o garimpeiro Sebastião Silva, que residia em Bagagem, embrenhou-se no meio do cerrado. Ao descansar nas encostas de um córrego, descobriu cascalho brotado.  “Cavando o cascalho, Sebastião encontrou diamantes e, rapidamente, a notícia se espalhou pela região, atraindo várias pessoas ao local. 

Nos três primeiros anos de exploração, a mineração atingiu o ápice de prosperidade. Logo, o vilarejo começou a se multiplicar. A ânsia pela prosperidade rápida e a exploração rudimentar do solo, características típicas da colonização portuguesa no Brasil, transformaram o manancial de águas límpidas em um córrego barrento, dando origem ao nome do povoado: Água Suja”. (Vieira, 2001). 

E dali, os devotos de Nossa Senhora da Abadia saiam, anualmente, para Muquém (GO), conforme registra Vieira: “Devotos de Nossa Senhora da Abadia, de Água Suja e de toda a região, saíam, anualmente, em romaria até Muquém (GO). As dificuldades encontradas nas peregrinações, principalmente, pela distância e pelos caminhos inóspitos, fizeram com que o influente morador do povoado, Joaquim Alves Ribeiro, mandasse, em 1870, uma delegação ao bispo de Goiás solicitando a autorização para a construção de uma capela, em Água Suja.   O bispo concedeu autorização, pois Água Suja já era habitada por cinco mil pessoas, um universo considerável de fiéis”.

“Naquele mesmo ano, uma imagem de Na. Sra. da Abadia, feita em Portugal, chegou ao povoado. Ainda em 1870, a  comunidade de Água Suja enviou um representante, o português Custodio da Costa Guimarães, a então capital do Império, Rio de Janeiro, com o objetivo de fazer aquisição da imagem na casa comercial de Franco & Carvalho. A imagem de madeira castanheira, esculpida pelos portugueses, foi transportada em carros-de-boi até a cidade de Água Suja (Damasceno, 1997). 

As romarias, surgidas em 1870, começaram a ter uma expressividade maior a partir de 1900, com a chegada dos padres espanhóis Agostinianos Ricoletos, a quem cabia a gestão das festas à Na. Sra. da Abadia. “Essas festas traziam para o povoado de Água Suja algo entre 30 e 45 mil romeiros”. (Vieira, 2001) 

 

E sete anos depois chegou a Sacramento 

É difícil precisar quando começou a peregrinação dos sacramentanos a Água Suja, mas por certo ela confunde com o início da devoção na cidade, em 1877. Aqueles que a trouxeram, eram, sem dúvida, romeiros a cavalo, a pé ou de carro de bois.  

Em 1933, no jornal, O Romeiro, que era publicado pelo Santuário, o padre holandês,  Eustáquio van Lieshout, que em  2 de março de 1926, assumiu a paróquia de Romaria e de outras duas paróquias: São Miguel, de Nova Ponte, e Santana, de Indianópolis,  publicou um artigo no qual demonstra de forma poética a Festa de Nossa Senhora da Abadia. Em vários trechos ele cita os caminhantes. 

“Apenas começa o mês de agosto, de longe, de muito longe, doentes e sadios iniciam a dirigir seus passos ao santuário de Água Suja. Romaria! E o sol pode queimar, a poeira pode se levantar em nuvens, a sede pode apertar o comprimento da viagem, pode dar cansaços e estragos, mas o verdadeiro devoto não desfalece nem recua, ele há de ajoelhar aos pés da excelsa mãe, Nossa Senhora da Abadia (...).  Nos carros, automóveis, caminhões, a cavalo, a pé, vem chegando romeiros dia e noite...”. (Pe. Eustáquio, 1933, p. 2)

De Sacramento, lembranças mais próximas de nós, muita gente pode ainda recordar-se não apenas dos romeiros que se dirigiam desde então ao Santuário de Água Suja, a pé ou a cavalo, de caminhões cedidos por empresários da cidade, que saíam lotados de devotos para o dia da festa. Além de famílias inteiras de carros próprios, Kombis e ônibus. 

E há na cidade, muitos anciãos que foram a pé aos pés da Virgem por mais de 30 anos, chegando aos dias de hoje. Não raro encontrar romeiros com mais de 30 anos de caminhada. E, mais recentemente, grupos de ciclistas têm também demonstrado sua fé e seu amor a Nossa Senhora da Abadia, hoje padroeira do Triângulo e Alto Paranaíba,  percorrendo os 140 quilômetros de pedal.

De acordo com historiografia   encontrada, a manifestação de devoção aumentou ainda mais a partir da década de 1970, com a adoção das diretrizes católicas propostas pelo Concílio Vaticano II, que valoriza a religiosidade popular. E, mais recentemente, ganhou mais voga ainda, graças à ampla divulgação virtual.

 De Sacramento, é sabido, saem anualmente centenas de romeiros a pé, de bicicleta, a cavalo ou de veículos que vencem os 140 km até os pés da santa, movidos pela devoção secular, passada de geração a geração, pagando promessas, pedindo graças e agradecendo por graças recebidas. Afinal, Nossa Senhora da Abadia está presente nas terras do Borá há 142 anos. 

A partir de 1991, ganhou uma Igreja no bairro Chafariz, que se tornou Matriz de Nossa Senhora da Abadia, a partir da criação da Paróquia de Na Sra. da Abadia, em 2010, que teve como primeiro vigário/pároco, Pe. Eduardo Edney.