Bala de borracha fere trabalhador no quintal de sua casa
Vicente de Paulo dos Santos, 27, operador de máquinas da empresa de batatas, Trevisan, levou um tiro a queima roupa com bala de borracha, na noite da sexta feira, 9, desferido por um soldado da PM, no quintal de sua casa.
De acordo com o casal, Vicente chegou na sexta feira à noite e começou a discutir com a mulher, Márcia. “Nós tivemos uma discussão, como acontece com todos os casais, mas o meu cunhado bêbado veio brigar comigo. Eu o empurrei pra fora e ele disse que ia buscar um revólver pra me matar. Voltei pra dentro de casa e, depois de um tempo, ouvi um grito dele, me chamando pelo nome. Achando que ele estivesse armado, uma vez que ele saiu falando que ia buscar um revólver, eu tomei de uma cadeira para me defender, em caso de agressão, e saí de casa pela porta da cozinha. Só que ele voltou com a polícia e quando eu virei o canto da casa, segurando a cadeira, me deparei com a polícia, que me deu um tiro de bala de borracha na barriga. Voltei pra casa, mas caí no chão logo que entrei”, contou.
Segundo Vicente, a Polícia não anunciou que estava entrando. “Eu pensei que fosse meu cunhado e o policial deve ter pensado que eu ia agredi-lo, mas eu não sabia que o meu cunhado estava com polícia nem a polícia anunciou a sua chegada. Quando eu levei o tiro, corri pra dentro de casa e caí, a dor era forte demais. O policial veio pra dentro com a arma apontada e o meu filho gritou: 'papai já está morto'. A polícia me arrastou pelo braço, me jogou no camburão e jogou a cadeira por cima e me levou para o hospital, onde passei por cirurgia para tirar a bala que alojou no lado direito da barriga. Quando dei por mim, estava no quarto algemado na cama”, explica, lamentando que a cena tenha sido presenciada pelos três filhos de 9, 7 e 3 anos.
Arma encontrada
De acordo com a esposa Márcia, no hospital, a PM a chamou para ir até a casa para uma revista. “Acompanhei os policiais e quando chegamos fiquei na cozinha com um policial e o outro entrou no quarto. E depois voltou e me chamou pra eu acompanhar a vistoria. Ele olhou aqui, ali e foi em cima do guarda-roupa e pegou um revólver. Aqui em casa nunca teve revólver, nunca houve isso em casa. Vicente ganha apenas o suficiente pra gente viver uma vida decente, não dá pra comprar revólver. E revólver pra quê? Alguém colocou esse revólver aqui pra incriminar o meu marido”, conta, acrescentando que o irmão que chamou a polícia, desapareceu. “Depois que a polícia deu o tiro, meu irmão sumiu, não vimos ele mais”.
Ainda de acordo com Márcia, no momento em que o policial deu o tiro com a bala de borracha, outro policial que o acompanhava se assustou. “O outro policial levou a mão a cabeça e falou: 'O que você fez!'. Lá de fora juntou muita gente e o policial que atirou ficou bravo com as pessoas. As pessoas assustaram, porque conhecem o Vicente, sabem que é trabalhador, se dá bem com as pessoas. As pessoas mal o vêem , porque ele sai de madrugada, trabalha de domingo a domingo, às vezes nem dorme em casa. Todo mundo ficou bobo com o que aconteceu. Meu irmão sumiu. O meu menino de 9 anos (I. O. S), quando a polícia entrou e o pai estava caído, ele abriu os braços e pediu: 'Não atira no meu pai, que ele está morto'”, conta.
A arma não é minha
Vicente, que recebeu alta na quarta-feira e está com 16 pontos externos no abdômen, espera justiça. “A bala entrou e alojou. Em princípio, eu pensei que fosse mais de uma bala, porque foram três furos na camisa, mas era uma bala só, que na explosão ou impacto, partiu. Um pedaço ficou aqui no chão, o médico tirou um pedaço maior, que está aqui em casa e vários estilhaços”.
Para Vicente, a situação é inexplicável. “Eu tinha chegado do serviço havia pouco tempo. A caminhonete estava parada aqui dentro do quintal. Tomei banho e estava aí, discutimos. Já tínhamos nos entendido, e logo acontece isso. Discussão de casal é normal. Eu saio de casa às 5h00 da manhã pra trabalhar. Trabalho nas batatas com os Trevisan. Tem dia que nem venho em casa, porque é muito serviço, trabalho o dia inteiro, às vezes até tarde da noite. Agora estou perdendo dia de serviço, não sei como vai ficar agora. Nem sei quando vou poder trabalhar. Meu patrão esteve aqui, me deu o maior apoio e vou ver como fica agora. Mas espero justiça.
Sobre a arma encontrada pela polícia, Vicente nega que seja sua. “A arma que eles encontraram aqui não é minha, não tenho arma, alguém a colocou em cima do guarda-roupa. Com criança em casa, a gente vai deixar uma arma assim? A arma não é minha. Não agredi policial e nem ia agredir, levei a cadeira pra me defender do meu cunhado. Se a polícia tivesse anunciado eu não ia resistir”, explica e conclui: “É uma humilhação, a gente fica envergonhado. Se a gente fosse bandido como tantos aí... É muita humilhação e diante dos filhos”.
De acordo com a irmã de Vicente, que é enfermeira, o médico disse que a bala poderia ter atingido algum órgão interno. “O médico disse que, porque o Vicente é gordinho a bala não atingiu os órgãos internos. Se atingisse o umbigo, seria morte certa”.
O advogado Rafael Catani confirmou os fatos narrados pelo casal e disse que acompanhou o desenrolar dos fatos desde sábado à noite e continua agora no curso do processo.