Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Aos 90, Thermutes fala da vida...

Edição nº 1385 - 25 Outubro 2013

A ex-primeira dama do município, Thermutes Maria de Araújo, esposa do médico, de saudosa memória, Clemente Vieira de Araújo, que governou o município nos anos 50,  completou 90 anos no dia 23 de outubro. Para comemorar a data, Thermutes seguiu com a filha Iara Maria, para São Paulo, onde vai se encontrar com o filho primogênito, o médico Astolpho Araújo, a nora Gisele e os netos Daniel e Victor. Quanta alegria poder comemorar os seus 90 anos ao lado dos seus queridos a quem devotou durante toda sua longa vida um grande amor.

 

Thermutes e sua história de vida
Thermutes  é uma mulher de fibra, guerreira e que não envelhece nunca, pois sempre valoriza a vida e a alegria. Thermutes, filha de Acácio Novelino e  de Adelina Oliveira,  nasceu na fazenda  Córrego dos Pintos, no município de Sacramento e ali viveu até os sete anos ao lado dos irmãos Rosália (Zazá), Alice e Acácio. Com o falecimento do pai, aos sete anos, veio morar com a avó, D. Honória, na rua Comendador Machado, onde fez os poucos estudos  no Liceu do Colégio Allan Kardec. “Minha avó era muito brava”, recorda.
Do tempo de escola, Thermutes se lembra bem do professor Antenor Germano. “Nas aulas de Educação Física ele mandava levantar os braços, e como eu não conseguia, ficava de castigo. Eu tenho os braços tortos, porque quando era criança, minha irmã Alice me colocou numa barrica pra brincar e eu quebrei o braço”.
Antes de concluir o quarto ano, Thermutes mudou-se para morar com a madrinha em Ribeirão Preto. “Minha vida foi na casa dos outros até me casar. Fui criada sem pai nem mãe. No começo morei com minha avó, depois com minha madrinha. Tenho muitas lembranças da madrinha e do padrinho Manuel Soares, pai do Labieno Soares e do Rolando. Ele era muito bom, caridoso, curava muita gente, aprendi muito com ele”, elogia.
Mas o tempo em Ribeirão Preto foi curto. “Minha madrinha adoeceu e eu vim embora. Fui morar com a D. Afonsina, mãe da Dirce, da Luzia e do Georginho. D. Afonsina tinha um hotelzinho e fui trabalhar com ela.  E foi lá no hotelzinho que  conheci o Clemente”.

 

15 anos de namoro
Thermutes se recorda que Dr. Clemente se formou no Rio de Janeiro e veio trabalhar em Sacramento e Conquista. “Sacramento, naquela época, não tinha nada, totalmente sem recursos. Não havia calçamento, eram poucas casas... O Clemente foi  morar na casa do meu padrinho, Manuel Soares, e montou o consultório numa das salas. E ele freqüentava o hotelzinho da D. Afonsina. Era muito jovem. Quando nos conhecemos,  ele sabia que eu era pobre, que não tinha pai e mãe, mas ele falava que iria se casar comigo. Dizia que  eu era a morena dos olhos verdes. E nos casamos, mas depois de namorar 15 anos (risos). Nosso casamento foi no dia 9 de abril de 1953”.
Com o casamento, Thermutes realizou o seu sonho: o de ter a própria casa, aliás uma exigência dos tempos de namoro. “Eu dizia prá ele: 'quem casa quer casa'(risos).  “casamos e mudamos para nossa casa (na rua Capitão Ferreira, onde ainda reside). Eu dizia para o Clemente que sempre morei na casa dos outros e que  quando  me casasse queria a 'minha casa' e de fato tive.  O consultório do Clemente sempre foi aqui em casa e eu sempre ajudava as pessoas, como meu padrinho Manuel Soares fazia. Eu aprendi com ele e  limpava as feridas, às vezes, receitava e distribuía remédios de amostra grátis. O Clemente ficava uma fera, mas eu queria ajudar as pessoas e não deixava o  Clemente cobrar as consultas dos pobres” (risos).

Os filhos Astolfinho e Iara
Thermutes e Dr. Clemente tiveram dois filhos Astolfo, médico em São Paulo, e a professora Iara Maria, ambos criados com todo mimo. “Eu era 'tarada' pelos meus filhos, acho que como fui criada sem pai nem mãe, então eu queria protegê-los de qualquer jeito. O Clemente até me criticava. É amor demais por eles. Quando eles estudavam na Escola Coronel, bastava o tempo fechar que eu pedia pra Cici (Da. Aracy) deixá-los vir embora. Ou, então eu ia buscá-los com a Dunga, do Cridi, que tinha carro. Acho que ser mãe como fui, nenhum filho gosta, porque eu protegia demais. Nunca bati, só olhava e deixava de castigo”.
Lembra que exigia demais dos filhos na escola, especialmente do primogênito. “O Astolfinho tinha que tirar só o primeiro lugar. Quando vinha com o boletim com o segundo lugar,  eu e ele chorávamos juntos. Aliás, Astolfinho sempre foi um menino emotivo, até declamando poesia ele chorava e eu também. Já da Iara eu não exigia tanto, tinha dó. Ela era muito fraquinha (risos). Mas sempre me deu grandes alegrias, foi sempre muito bem sucedida em tudo o que fez como bancária, como professora e hoje é minha companheira de todas as horas.
 Mas o zelo maternal de Thermutes segue até os dias atuais, sempre se preocupa com os filhos e,  os netos. “Uma das maiores alegrias da minha vida foi o Astolfinho se formar médico. O Clemente já havia falecido. Eu chorei e ri demais, nem acreditava que ele tinha se formado. E sempre peço pra ele cuidar bem das pessoas e que ao atender pense  em mim, porque é muito triste ser maltratado. Mas a minha preocupação com ele ainda é grande. Às vezes via na televisão que estava  chovendo em São Paulo, eu ligava e pedia pra ele não sair (risos). Hoje não faço isso mais, mas me preocupo”.  

 

A primeira dama
Dr. Clemente Vieira  de Araújo foi prefeito de Sacramento por quatro anos (1955/1958), tempo em que teve total apoio da esposa Thermutes, que mesmo como primeira dama, continua a Thermutes de sempre, mulher simples e dedicada. “Para mim nada mudou pelo fato de Clemente ser prefeito. Nunca gostei de aparecer, aliás até escondia quando pessoas vinham procurar o Clemente. Sempre fui muito simples. Mas como o Clemente era prefeito,  eu queria era ajudar mais as pessoas.
Thermutes tinha o costume de levar lanche para os funcionários da prefeitura. “Quando ficava sabendo que os operários estavam trabalhando  até mais tarde, eu fazia bolos, leite e café e levava para eles.  Gostava muito dos funcionários da prefeitura, lembro do Sr. Orozimbo, do Filinho, Odorico e esqueci o nome de um que tirava pedras para calçar as ruas... o Temístocles. Eram pessoas que não saiam daqui de casa. Eu gostava muito deles.  Havia funcionários que faltavam muito, o Clemente ficava bravo, mas eu não gostava que ele anotasse as faltas” (risos).
Dr. Clemente conciliava as atividades na prefeitura e no consultório, onde era  sempre auxiliado por Thermutes, a companheira de todas as horas. Amizades e personalidades do meio político foram muitas em sua casa. “Nesse tempo de Prefeitura, o Clemente, angariou muitos amigos: Magalhães Pinto, Rondon Pacheco, Francelino Pereira, pessoas que vinham dormiam e comiam aqui em casa”, lembra.
Os poucos estudos foram suficientes para que  Thermutes se tornasse uma autodidata, pelo gosto pela leitura, até pouco tempo uma leitora assídua do 'Estadão', e toda a  movimentação política em casa, serviu para  apurar o gosto pela política, nato em Thermutes .“Eu gostava de política e eu mandava (risos) no Clemente, em muitas coisas, mas sempre tive minha opinião. Lia muito, o jornal O Estado de São Paulo, através da leitura aprendi muito. Adorava o Carlos Lacerda, Castelo Branco e o Collor. Depois, votei no Lula para consertar o Brasil, votei na Dilma, porque queria uma mulher pra governar. Em 1964, fizeram um movimento e tiraram a dona Aracy da Escola. Eu fui atrás da mulher do Magalhães Pinto, aqui em Sacramento e 'exigi' a volta dela. Não podia aceitar uma  coisa daquelas, tirar uma diretora de escola...”.

 

Completar 90 anos...
Mulher de fé, Thermutes que acredita na força de Deus, chega aos 90 anos cheia de energia e felicidade. Um exemplo de mulher, que conseguiu manter a família unida e hoje desfruta o carinho dos filhos e netos. Uma mulher que chorou diante das perdas, mas que muito se alegra com os belos momentos que a vida se lhe reserva, como este, comemorar 90 anos, que para ela é um momento de agradecimento.
“Agradeço a Deus pela minha vida, minha família e  meus muitos amigos. Agradeço  pela saúde que tenho Nunca fui ao hospital.  Durante toda a minha vida só procurei fazer o bem, como o Clemente, vivemos com honestidade. Vejam vocês, que um médico e ex-prefeito que morreu pobre, mas rico de coração”.
 Questionada qual seria a sua maior alegria no dia do aniversário, Thermutes foi categórica: “Eu gostaria que o Clemente estivesse aqui”. E completa, afirmando que a maior alegria que tem hoje são os “meus netos Daniel e o Vitinho, o meu filho Astolfinho e sua mulher Gisele, e a minha filha Iara”.

 

Parabéns, Da. Thermutes!