Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

A vida está de luto

Edição nº 1189 - 22 Janeiro 2010

 

Sandra Almeida (*)

 

Dentre as inúmeras mensagens de condolências à família de Dra. Zilda Arns, divulgadas pela mídia, a que mais me comoveu foi esta: “A VIDA ESTÁ DE LUTO!”

Dra. Zilda foi o instrumento divino que gerou muitas vidas. Sempre a vía-mos no meio de crianças paupérrimas, desassistidas pelos nossos governantes e principais responsáveis pelo bem estar do cidadão. No meio de seus valentes voluntários ela se fazia um deles em sua simplicidade, humildade e trabalho. Seu despojamento era tão grande que não se importava de ser chamada simplesmente de D. Zilda.

Sua vida foi de grandes e trágicas perdas. Perdeu o esposo e dois filhos dra-maticamente e não perdeu a fé...

Escolhida por Deus antes mesmo de ter nascido, Dra. Zilda foi encarregada pela CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) de fundar a Pastoral da Criança em 1983, cujo objetivo é acompanhar o desenvolvimento de crianças menores de seis anos, gestantes e famílias pobres. Seu ponto forte era junto às mães para que aprendessem a cuidar de seus pequenos e se tornassem multiplicadoras.

Fazendo-se cada vez mais forte e perseverante foi capacitando líderes voluntários para orientar e acompanhar entre dez a quinze crianças vizinhas, incutindo nos pais e responsáveis noções básicas de saúde, nutrição, educação e cidadania.

É impressionante o legado deixado pela grande missionária: hum milhão e seiscentas mil crianças menores de seis anos atendidas; hum milhão e duzentas famílias pobres atendidas em 4.063 municípios em todos os Estados; em 2008 fundou a Pastoral da Criança Internacional no Uruguai a qual reproduz a experiência brasileira em 19 países, inclusive o desolado Haiti. 

Em 2004, nova missão foi-lhe confiada: a Pastoral da Pessoa Idosa, que or-ganiza a comunidade para multiplicar os conhecimentos e a solidariedade com os idosos, já atendendo a 165 mil idosos em 700 municípios e com 17.218 líderes formados.

Diante de uma missão de tal expoente, todas as lágrimas derramadas e nosso grande pesar, são poucos para manifestar nossa admiração e reconhecimento. Sua ausência será demais sentida, principalmente, pelos inocentes e mais abandonados.

O trabalho social e humanitário realizado pela médica lhe rendeu incontá-veis prêmios nacionais e internacionais, inclusive foi indicada por quatro vezes pelo nosso governo ao Nobel da Paz.

Era imensamente respeitada pelo poder público federal, sobretudo no Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Conhecendo nossos líderes, já sabemos das dificuldades que seus seguidores terão daqui para frente.

Sem medo de errar, Dra. Zilda pode mesmo ser chamada de “exemplo de santa secular, modelo de mãe, médica e missionária”.

O Brasil perdeu a sua mãe. Os nossos pequeninos ficaram ainda mais aban-donados e desnorteados sem a mãe que lhes deu a vida e amor.

Até na sua morte ela deixou-nos o exemplo de missionária, confiante no amor de Deus e nos acenando para continuarmos a gerar vidas na caridade, na solidariedade e na misericórdia: a igreja onde ela estava foi totalmente varrida do Haiti, porém, um grande crucifixo continuou incólume, bem à beira do que antes parece ser uma rua. Foi  o sinal de Dra. Zilda para que seu trabalho não seja abandonado, que valeu a pena e que Ele continuará com todos os de boa vontade até o fim.

O intrépito bispo emérito de Blumenau, D. Angélico Sândalo Bernardi-no,recebeu a seguinte mensagem de Natal e Ano Novo de Dra. Zilda: “Conhecer Jesus pela fé é nossa alegria. Segui-lo é uma graça.E dar testemunho, a doação aos outros, é um serviço que Ele nos confiou”. 

Ela partiu sem levar seus prêmios, medalhas, moções, poder, mas foi com as mãos repletas de obras, de caridade e amor ao próximo.  

O nome de Zilda Arns será sempre dito com reverência e admiração e sua luta haverá de ser continuada e plena de frutos que durarão para sempre, como ela.

Obrigada, Dra. Zilda, pelas vidas de tantas mães e de tantos filhos.

 

 

(*) Sandra Almeida é oblata redendorista