Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Irmãos Loyola: Geraldo Antônio e José

Edição n° 1346 - 25 Janeiro 2013

Uma empresa construída a seis mãos, abnegadas, dispostas, sempre limpas no sentido da ética e da moral e, principalmente, orantes. Geraldo, 89; Antônio, 84 e José 76, os sócios da empresa Irmãos Loiola Ltda há 40 anos. Herdaram todos esses predicados, dizem eles, dos pais, Ignácio Amaro de Loyola e Ana Bárbara de Carvalho Loyola, da fazenda Aldeia, onde nasceram e cresceram junto a outros cinco irmãos, Elias (Déa), Air (Beta), Inácio (Derly), irmã Bartolomeia (Nair) e Agnes. 

Geraldo é casado há 64 anos com Leonide Vicentine Loyola, pais de cinco filhos Rita, Maria do Carmo (Pama), José Amaro, Toninho e Ângelo; Antônio, viúvo de Aparecida Cerchi Loyola, a esposa de 44 anos de vida a dois, juntos criaram os filhos  Virgínia, Tomaz, Maria e Maria Abadia  e,  José, casado com Iracy Silva Loyola são os pais de Maria Emília, André,  Maria Luísa e Ana Maria. Três histórias maravilhosas, construídas juntas, no diálogo e na convivência verdadeiramente fraterna. Vamos ver.

 

ET - Vamos começar com o Sr. Geraldo, que, por ser o mais velho da prole Loyola, deve ser o guardião da história... 

Geraldo - Quem vai saber muita coisa mais é o José, mas vamos lá. Nós nascemos na fazenda Aldeia. A fazenda era dos nossos avós,  Tomaz Luiz de Oliveira e Laurinda  Cândida dos Anjos e cada um dos filhos ia casando e ficando por lá. Antigamente era assim, mas cada um cuidando do que era seu, éramos independentes. Lá estudamos com dona Olga Carvalho, eu, o Antônio, o Elias e a Air . Os mais novos já estudaram na cidade. No terceiro ano, meu pai mandou a gente pra estudar em Uberlândia. Ficamos na casa da tia Inácia, irmã da mamãe, mas por  pouco tempo e voltamos pra fazenda.  Eu vim pra cidade tinha uns 15 anos com os irmãos, morar em uma casa que meu pai comprou. Como primogênito, fiquei sendo o chefe.

 

Antônio - Mas os mais velhos estudamos pouco, só o primário. Já os outros todos se formaram. Geraldo, Elias e eu paramos de estudar e fomos trabalhar. Air, Anair e Agnes fizeram o Magistério,  Inácinho e José fizeram Contabilidade, e quem fez faculdade foi só o Zé. Mais tarde, até pela profissão, fiz aulas particulares de português com dona Corina, lia muito. Depois, o Geraldo e eu fizemos curso de Contabilidade por correspondência.

 

ET - E o José, o caçula dos irmãos, fez Direito?

José – Sim; 12 anos após me formar em contabilidade, prestei o vestibular para o curso de Direito na Faculdade de Direito do Triangulo Mineiro em 1966 tendo me formado em 1971.

Comecei a trabalhar como empregado em 09/06/1951, na firma Garcia & Cia, agencia Chevrolet, como faxineiro e auxiliar de escritório, até janeiro de 1958, quanto então já era o responsável pela contabilidade que era padrão G.M.

Em 1958 fui convidado para trabalhar na firma Silvio Crema & Cia, onde fiquei ate dezembro de 1971, quando então juntamente com Geraldo e Antonio iniciamos Irmãos Loiola  e anexo ao escritório da empresa montei meu escritório de advocacia.

 

ET - Antes de falarmos do trabalho vamos voltar um pouquinho na família. Seus avós paternos eram Tomaz Luiz de Oliveira e Laurinda Cândida dos Anjos. De onde saiu o Loyola?

Antônio - Isso é até engraçado, porque nasceu de uma promessa.  Minha avó batizava os filhos, as vezes, com o nome do santo do dia: Domingos Félix de Oliveira, José Martins de Oliveira, Francisco Estevão de Oliveira, Inácio Amaro de Loiola, Adão Firmino Vilela e Geraldo Magela dos Santos, todos irmãos. Já o meu pai não nasceu no dia de Santo Ignácio de Loyola e sim no dia de Santo Amaro, porém, vovó tinha uma promessa de batizar um dos filhos com o nome do santo. Aliás, meu pai não gostava do nome e dizia que iria mudar, mas aí nasceu o Inacinho, justo no dia de Santo Ignácio Loyola; não teve outro jeito, a não ser ficar com o nome. Muitos 'Oliveiras' aqui da cidade são da nossa família. Só nós, filhos de Ignácio Amaro de Loyola, e nossos descendentes temos este sobrenome.

 

ET - E, vocês, já rapazinhos começaram a trabalhar na cidade?

Geraldo - Comecei a trabalhar numa confeitaria do Sr. Ariovaldo Afonso, onde é hoje o Banco Itaú, de lá fui para a máquina dos Crema, trabalhar com o seu Angelo Crema, Silvio Crema (Lelé) e Clemente Marzola. O Sr. José Silveira foi quem arrumou emprego pra mim lá. Tinha pouco mais de 16 anos, fui a título de experiência e lá fiquei até 31/12/1971. Tive a honra de entrar varrendo e de sair sócio.

 

Antônio - Eu fui para os Crema, quatro anos depois do Geraldo, surgiu uma vaga e ele arrumou pra mim e lá fiquei até 1971.  Mais tarde, em 1958 o Zé foi pra lá também; fez Direito e continuou trabalhando conosco. Em 1972, separamos a sociedade com o Silvio Crema, abrimos a nossa empresa Irmãos Loyola.   

 

ET - Como nasceu a sociedade entre vocês, empregados, e o seu Lelé, o patrão?

Antônio – A empresa Ângelo Crema Cia, era uma firma grande, que trabalhava com arroz, café e feijão.  Acontece que o Silvio Crema tinha sociedade com o Ângelo Crema, Clemente Marzola, Ferrucio Bonatti e Sebastião Scalon, que em 1952 se afastaram da empresa. Os meninos do seu Silvio Crema, Renato, Rinaldo, Ricardo, Roberto e Rui, eram todos crianças e o movimento que já era grande foi aumentando. Era um tempo de muito café, muito arroz no município.  E o seu Silvio Crema ficando sozinho, nos convidou para uma participação. Eu comecei lá em 1944, mas só em 1954 começamos a ter participação. E o combinado era que a sociedade só duraria até os meninos dele crescerem. E assim foi, em 1972 acabamos com a sociedade.  Seu Silvio Crema ficou lá com os filhos dele e nós abrimos a nossa empresa.

 

ET – Como dizem, era o auge do café, do arroz e feijão no município. Pra onde ia essa produção?

Antônio - Era realmente o auge. O arroz e feijão ia pra São Paulo e o café pra Santos. No começo era transportado de trem. O Zé Veio, filho do Zorico, era o dono da linha que fazia o transporte Sacramento – Estação do Cipó, onde o trem passava. A carga era guardada no armazém da estação até o embarque. Quando acabou a Mogiana, a primeira pessoa a fazer o transporte rodoviário pra nós foi o Sebastião Rezende. Eu ia pra São Paulo vender o arroz e ele arrumava os caminhões pra levar. O Alfredão, Zé Margarida, Sebastião Rezende e outros transportaram muito arroz e café.

 

ET - Na opinião de vocês, o que causou essa queda na produção de arroz e café?

Antonio -  Não sei bem... Mas tem muitas causas.  Parece-me que as terras cansaram, a diversificação das culturas, transformando em pastagens e investindo em gado, muita gente se mudando das fazendas. No auge, havia muitos produtores de arroz no município, desde pequenos até produtores grandes. Todo mundo plantava, os pequenos, para o sustento, e aquilo que sobrava, vendiam. A região do Cocal dava muito arroz. Mas acredito que o principal fator é que começou a chegar um arroz mais barato que vinha do Sul, até que o arroz sumiu, fazendo fechar todas as  máquinas de beneficiar arroz. O café também diminuiu bastante e olha que o município produzia muito café, além disso  ainda vinha de outras localidades. E houve também uma época que o preço caiu muito e o pessoal foi abandonando as lavouras. Além de que o tempo também mudou. Hoje chove bem menos. 

 

Geraldo - Acredito que a produção do município chegasse a 100 mil sacas de café beneficiado e mais 100 mil sacas de arroz. Além da produção que comprávamos de outros municípios, como de Araxá, Ibiá, Perdizes e Conquista. E não eram só os Crema que trabalhavam com café; Havia na cidade também os Bonatti; o Cruvinel, Mario Afonso Primo, Paulo Araujo, que só beneficiava arroz;  o Dr. Juca trabalhava só com café; o Clanter e o Zé Gobbo, que tinha até torrefação. E café tinha preço, valia dinheiro, era outro câmbio e o Instituto Brasileiro do Café (IBC) funcionava muito bem, garantindo um preço mínimo. 

 

ET - Trabalhando com exportação, enviando café prá Santos no início da empresa, nos anos 70, como eram essas vendas?

Antonio - Antes disso, lá nos Crema fui muitas vezes ao Rio de Janeiro levar amostra de café, porque pelos correios demorava. Pegava o avião em Uberaba, aqueles aviões pequenos, ia para São Paulo e fazia conexão para o Rio, já num avião grande. Era quase um dia de viagem... Hoje, sem dúvida, é uma facilidade muito grande. Telefone era difícil, correio, tudo muito demorado, difícil. Tínhamos que levar as amostras em mãos.

 

ET - Como é ver e viver essa evolução da época que vocês começaram e os dias atuais? Quem domina aqui a computação? (risos)

Antonio - Olha, a mudança foi muito grande, da caneta de pena, o tinteiro separado, o mata-borrão, os livros de contabilidade todos feitos a mão, as somas do livro caixa, nada de calculadora... tudo de cabeça. Muitos anos depois chegou a divisuma, uma máquina de somar enorme com um barulho que mais parecia uma metralhadora. Depois veio melhorando, chegando as calculadoras até chegar ao computador, a era digital. Sorte nossa que temos o Marcelo pra mexer com essa parte, mas eu aprendi a acessar a bolsa e o clima. Só que está tudo programado, é só chegar dar uma clicada e já aprece tudo (risos). Mas eu ainda quero aprender. 

 

Geraldo - Não aprendi a mexer com computador, não... E não sei se quero aprender, também, não (risos).

 

ET - Mas a vida de vocês não foi só de trabalho, claro...

Geraldo - Devagarinho a gente foi fazendo um pé de meia e graças a Deus tivemos uma vida boa. Nide e eu criamos os filhos. Tivemos muita sorte com nossos filhos, todos estão formados. Até o Toninho que não havia formado, agora fez faculdade, lá no Mato Grosso. Eu viajei muito a trabalho. Ia para Goiás pra comprar arroz e feijão a Santos, São Paulo, mas tudo a trabalho, mas tirava uns dias no ano para sair com a família, os meninos ficavam contentes.  Tivemos uma vida boa. Eu gostava de pescar de canoa com os companheiros, o Reverendo, Zé Margarida, Toninho Bianchi, Sílvio Crema. Mas pescaria era quando dava, porque trabalhávamos muitas vezes até aos domingos. E, depois, Antônio e eu compramos a parte do papai na fazenda Aldeia, que cuidamos até hoje.

 

Antônio - Nunca pensei em ter um grande patrimônio, minha maior preocupação foi dar uma boa educação para os filhos, hoje todos com curso superior, uma vida digna para a família. Não me preocupei em juntar bens, a prioridade foi educar os filhos, viver bem com a família, este é meu maior patrimônio, sinto-me realizado. Viajava muito a trabalho. Depois, com a família mais criada a gente viajava, levava os meninos para conhecer os lugares, não era como hoje que o povo viaja muito, mas a gente prezava isso muito. E eu tinha uma paixão, a pescaria, pesquei muitos anos no rio Grande com o Zé Dentista, o Arnaldo Pavanelli, Onobuji e o Pimpão. Quase todo domingo a gente estava no rio, era uma época boa, muito peixe. A diversão começava no arrancar as minhocas lá na chácara do Onobuji e ele levava a pinguinha dele pra aperitivo, mas a gente não bebia muito, não, era só aperitivo mesmo. Mas depois tudo vai acabando...

 

ET - A grande contribuição que a família Loyola deu para a cidade está na valorização da família, tornando-se uma referência ética, moral, digna, além de  religiosa. A quem vocês devem essas virtudes?

Geraldo - Aos nossos pais; Meu pai era exigente e gostava que a família andasse direito, que fosse honesta, cumprisse seus deveres e compromissos. E a mamãe também, zelava muito dos filhos. Rezávamos todas as noites antes de dormir. Devemos muito ao seu Sílvio Crema também, ele nos ensinou muito.

 

Antonio – É verdade, isso tudo vem de meu pai e minha mãe, dos avós, desde pequenos nos ensinando religião. Duas coisas me marcaram.  A gente não dormia sem rezar, nem sem tomar banho. A gente morava na roça e naquele tempo as pessoas não usavam tomar banho todos dias, mas a mamãe não deixava dormir sem estarmos limpinhos. Vovó era muito religiosa e a gente veio aprendendo. 

 

ET - Vocês sempre foram também muito engajados socialmente, na filantropia e também na política desde os tempos do Juquismo...

Antônio – É, a gente sempre procurou fazer a nossa parte e até hoje fazemos, contribuindo com várias entidades. Na política, de fato sempre estivemos ligados, sempre fomos companheiros políticos dos Crema, Dr. Juca Ribeiro, Alberto Marques Borges, Ferrucio Bonatti e José Afonso Borges(Zé Pando) e outros; Mas da família, só Inacinho e o Zé estiveram mais diretamente envolvidos, foram vereadores. Mas tem uma coisa, sempre tive meu lado político, mas sempre respeitei os adversários. Nunca tive divergências com ninguém.

 

ET – Engajado mais diretamente, candidatando-se a um cargo eletivo, que avaliação você, José, faz dessa experiência?

José – Faço uma avaliação positiva porque uma vez participando mais diretamente do processo político fica-se mais consciente das coisas da nossa comunidade, de suas potencialidades, de suas carências; sempre defendo que todo cidadão deve participar da política, mesmo que não dispute cargos eletivos deve estar engajado no processo político, ser formador de opiniões, dialogar, ouvir idéias, respeitar acima de tudo as opiniões contrarias e apoiar sempre as boas causas.

 

ET. Que lição vocês tiram da vida?

Antonio - Olha, estou com 84 anos e trabalhando. O Zé saiu da sociedade e continuamos Geraldo e eu. Isso aqui é pra gente não ficar à toa. A gente não pode parar, acredito que enquanto temos condições, temos de trabalhar. Isso é saudável, é distração,  encontra um, encontra outro. A gente se mantém ocupado, então enquanto eu puder vou continuar aqui. Mas digo com certeza de que valeu muito a pena tudo na minha vida. Agradeço a Deus por tudo, pela família, tive uma esposa, companheira fantástica, bons filhos, todos trabalhadores. E amigos como o seu Sílvio Crema que valorizou a gente e nos deu oportunidade. A vida é maravilhosa. 

 

Geraldo - Olha, valeu a pena, dava pra começar tudo de novo, se necessário fosse. Minha vida foi sempre muito boa e agradeço muito a Deus. A proteção divina que tivemos foi grande e é isso que nos dá mais ânimo. Vejam que tivemos uma coisa rara, porque desde aquele tempo são poucos que dão uma mãozinha para o empregado subir, crescer na vida. 

 

ET – José, seus irmãos querem dizer, em outras palavras, um ditado antigo, que 'a ociosidade é oficina de Satanás'... Deixando a empresa, o que está fazendo e se valeu a pena esse tempo de sócio com seus irmãos?

José – Deixei a empresa, mas não deixei de trabalhar, “Vade retro Satana”.

Administro minha propriedade rural tentando faze-la produtiva e cuido dos demais afazeres do cotidiano, só estou sem compromisso com horários, mas não ocioso.

Quanto ao convívio com meus irmãos, todos eles, (inclusive o Elias, de saudosa memória), só tenho a agradecer a Deus por tanta graça; como caçula só recebí apoio e benefícios; a única desvantagem de ser caçula é que fui subordinado a todos os irmãos, pois a ordem de meus pais era: “o mais novo deve obedecer o mais velho”.

Quanto a minha participação na empresa, ela se deu a convite de Geraldo e Antonio quando ao desfazerem a sociedade com Silvio Crema se prepuseram a fundar a Irmãos Loiola; eu tinha concluído o curso de direito e aceitei o convite e iniciamos nossa jornada juntos, que durou 36 anos de muito trabalho e alegria pois nunca tivemos desavenças, graças a Deus, um sempre preocupado com o outro.