Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Hebe Portella: 80 anos de vida, como filha, mãe e avó...

Edição nº 1361 - 10 Maio 2013

Com uma filosofia de vida que só ela tem,  Hebe Ribeiro Portella faz uma confissão de cara ao declarar o seu nome ao repórter. “Não gosto do meu nome” – afirmou, antes de pronunciá-lo. E olha que Hebe significa 'Juventude', 'Mocidade'. E prossegue: “Eu queria nome de princesa, grande, pomposo. Meu nome, para mim, parece marca de cachaça 'Hebe Ribeiro', ainda bem que agora, sou Hebe Ribeiro Portella. Hebe nasceu numa tarde chuvosa do velho Sacramento de 1932. E apressada, desde que veio à luz. “Lembro da minha mãe dizer, que quando chegou lá o doutor Cunha, eu já havia nascido. Não esperei o médico. 'Esta menina foi muito apressada' – disse o médico a minha mãe. E é verdade, não tenho muita paciência com esperar”, faz outra confissão. Mas vamos a essa deliciosa entrevista, contando um pouco da história de uma conversando com uma apressada filha, mãe durona e avó conselheira 

no Dia das Mães. 

 

ET – Da. Hebe, filha de um dos mais importantes políticos da cidade, Dr. Juca ou Juca Sacramento, como o presidente Getúlio Vargas o apelidou... Mas hoje, vamos falar de Mãe. Então, fale de Da. Maria Corazza Ribeiro...

Hebe - Mamãe  foi uma mãe extremosa, mas ela teve um trauma muito grande na vida. Ela perdeu as duas filhas de nome Ruth e  achava, naquele tempo, que Deus a castigava  por ela ser pecadora. E mamãe não tinha nada de pecadora, ela tinha vaidade. Mas penso que o sentimento de estar em pecado era fruto da religião daquela época. Mamãe se dedicava especialmente à Ruth, que nasceu cardíaca e, em razão desse desvelo todo, eu e meu irmão Amir nos sentimos privados de mais atenção... Ciúmes de criança. De me fazer, por exemplo uma trança, de me calçar as botinhas, de me botar no colo... Quando Ruth faleceu, com nove anos, eu estava com cinco anos.. Só mais tarde vim a perceber que o seu amor era devotado à Ruth por causa de sua enfermidade...  Mas a minha mãe, justiça seja feita, era amorosa, alegre, feliz, fazia muita festa para nós. 

 

ET – O fato de Da. Maria ser mulher de um grande político a fez também uma mulher atuante, militante?

Hebe - Mamãe foi muito presente na vida de papai e também na vida da comunidade de Sacramento. Ela era considerada a mãe dos pobres, trazia as pessoas para dentro de casa para dar leite, pão, dar todo tipo de assistência aos varredores de rua, aos leprosos que paravam a cavalo na porta. Ela nos passou uma figura de Assistente, presente, alegre e feliz. Isso devo a ela, mas eu comprava afeto o tempo todo, com a minha espontaneidade, as notas na escola,  declamar poemas. Enfim, eu gostava de aparecer, aliás fui muito aparecida na meninice e na juventude. Era uma gordinha, alegre, saudável com uma mãe que estava sempre muito presente e um pai, político, que estava sempre ausente, mas muito presente com afeto.  O interessante é que mamãe nunca me bateu, mas também não havia motivos para isso (risos). 

 

ET - E como foi a vida escolar dessa gordinha, alegre e saudável?

Hebe - Estudei na escola Normal. Minha primeira professora foi dona Alice Afonso, mulher de Antônio Machado. Ela ficou pouco tempo, mas me apaixonei mesmo foi pela segunda, dona Hilda, irmã de dona Iralva, do Zé Sebastião, que ficou conosco até o quarto ano. Eu fui uma menina feliz na escola, tinha facilidade para aprender. A diretora era a dona Maria Crema, a quem chamávamos Neneca. Foi um tempo muito bom, na escola que era ali onde mora a Maria do Carmo Chaer, ao lado do Sindicato Rural, depois a escola passou para onde é hoje. Eu acompanhei a evolução da escola, inclusive quando passou a se chamar Ginásio e Escola Normal de Sacramento, hoje Coronel José Afonso. 

 

ET – E sempre estudou ali, no Coronel?

Hebe – Não, aos 11 anos fui para o internato, Colégio Santa Marcelina, em São Paulo, para cursar o antigo Ginásio  (hoje, ensino fundamental, do 5º ao 9º ano – grifo nosso). Lá fiquei três anos, só que na 2ª série não passei no exame  de Francês, aí  falei que não voltava mais. Na época, papai estava trabalhando com dona Maria Crema, negócios da Escola. Foi quando ela cobrou a minha saída da cidade para estudar fora e aqui nesta sala, papai respondeu: “Maria, ela não quer voltar para São Paulo, então ela vai repetir o ano aqui no nosso Ginásio”. Aquilo foi minha realização. Foi muito boa essa época. Fui muito feliz. 

 

ET  - Lembra dos colegas?

Hebe - Claro, os colegas eram o Cleomar, Inacinho, João Marcelo, Antonio Cirilo, Ariosto, Roberto  Bessa. O Roberto era engraçado, tinha uma pose de intelectual. Das meninas lembro da Celma, Ester, Janete, Ionete, Lucila, Célia e Celinha... Foi uma época maravilhosa. Os professores eram cada um mais lindo que o outro. O professor Saulo Wilson era nossa paixão, falávamos que ele nos ensinava o verbo  to love (risos). Havia o Dr. Paulo da Graça Lima, Dr. Ângelo Manzan, o Sobral, que nos dava cola na lousa (risos). Declinação em latim. Perguntávamos como é professor? E ele ia na lousa, escrevia e nós copiávamos. 


ET – Da. Aracy Pavanelli era professora na época?

Hebe – Sim, dona Aracy era outra, que parecia um pavilhão nacional, majestosa, muito querida, muito presente na nossa vida. Dona Maria Aparecida Castanheira, na época a achávamos aborrecida, mas não era, ela fazia parte daquele todo. Aquele tempo foi como um bolo muito bem temperado.  Nos alimentamos com muita vontade, a vida de estudante era gostosa como um bolo de aniversário com todos os recheios. Acho que valeu a pena.

 

ET - Como foi a vida da adolescente Hebe Ribeiro e dos adolescentes da época?

Hebe - A vida continuou maravilhosa, claro. Nessa idade já iniciando um relacionamento com os coleguinhas... Mas não passava de flertes. (O Aurélio define como 'namoro ligeiro, sem consequência, namorico'. Mas Hebe diz que no seu tempo 'flertar' era trocar olhares – grifo nosso) Havia os correio elegantes na época das festas, mas o que havia mesmo era só o olhar, e a troca de recadinhos com os leva-e-traz.

 

ET – E na escola, havia algum tipo de orientação sexual para os adolescentes?

Hebe – Não, nada. Era muito diferente de hoje. Nós não tínhamos orientação nenhuma, sexo era um tabu. A gente não perguntava, não podíamos saber e ninguém falava. O que me admira e choca hoje com as minhas netas é que elas sabem mais do que eu. Elas sabem tudo, coisas que eu, mais velha do que elas hoje, não sabia.  Elas me dão aula. Eu me lembro que estava com 15 anos, ainda não havia menstruado e não sabia o que era isso. 

 

ET - E as festas?

Hebe - Festas, eu ia em todas. Nas festas rurais, eu dançava a noite inteira. O Teófilo Urias tocando e nós dançando a Mula Preta. Era uma delícia! As companheiras eram a Zeca, da Rita Parteira; a Helena e a Leda sobrinhas do Mezinho Duarte; Terezinha, Rita da Paixão... Íamos aos bailes pra todo lado. O Alcides, que era o motorista do papai, nos levava na caminhonete. E quem nos acompanhava era a Tiana do Lamartine. Com ela papai nos deixava ir. A nossa vida era muito pura naquela época. Tínhamos também as serestas, as festas religiosas, com novenas, procissões, barraquinhas, leilões, banda de música e foguetes de vara. Eu ia em tudo.

 

ET – Havia um clube social em Sacramento naquela época?

Hebe - Não, naquela época não tínhamos um clube. Então, os bailes de carnaval, formatura e os tradicionais eram no Armazém da Catação de Café do meu pai, ao som da orquestra do saudoso Rabelinho. E, durante o ano, tínhamos as brincadeiras dançantes nas casas das famílias. Êta tempo bão!! 

 

ET - Com o velho jardim e suas passarelas de mulheres para um lado e os homens para o outro...

Hebe - E sabe como tudo começou? Nós passeávamos na Visconde do Rio Banco. O vai e vem era ali na calçada entre a Igreja e a Farmácia do Vigilato, hoje do Herculano. No meio do quarteirão, havia a casa de uma solteirona, a Iridina, que ficava na janela e vivia falando da gente. A janela dela era na calçada, e ela ficava lá fofocando (risos). Eu não posso dizer quem foi o mentor, mas decidiu-se que era melhor a gente ir para a praça da Matriz pra sair daquele bochicho. E foi aí que começaram as voltas no jardim, as mulheres para um lado e os homens para o outro, por causa dos olhares que se cruzavam.  E havia outra coisa, o pessoal mais bem nascido dava volta por dentro do jardim, e os outros, gente mais simples, gente da roça e os mais pobres davam voltas por fora do jardim. E o bom é que não havia luz direita (risos). Mas era muito bom. Eu acho que nasci na época certa. 

 

ET -  Sacramento nessa época tinha uma atividade cultural capaz de absorver a atenção da cidade, com participação de vocês, jovens ainda, ou predominava um certo marasmo intelectual?

Hebe – De forma alguma, a cidade era ativa, atuante na declamação de poemas, na leitura de romances... Dona Corina, Da. Maria Crema, Da. Corália, Homilton Wilson, Dr. Ângelo Manzan, Macoy, Mugiquinho, Áurea Cunha eram jovens expoentes nessa época coordenando todo tipo de atividade cultural. Íamos para o Colégio Allan Kardec e lá fazíamos teatro. Havia festa no cinema, teatro, números musicais. Vivíamos em função da arte. Hoje, aos 80 anos, são inúmeras as poesias que ainda sei de cor. Dominava na época o Francês e tínhamos textos, livros em francês pra ler. E o professor Paulo da Graça Lima começou a introduzir o inglês, que existe até hoje no currículo.   


ET - Terminado o Ginásio, você  prosseguiu os estudos. 

Hebe - Que nada! Eu me apaixonei!! (risos). Dos 16 para os 17 anos, a idade da paixão, vivi uma paixão inevitável que precisou a intervenção de meus pais, me mandando para estudar em Belo Horizonte, no Colégio Marconi, onde cursei o primeiro ano do curso Científico. E como diz o velho ditado, uma paixão cura a outra (risos), conheci o Zé Portella em BH. Ele era sobrinho da tia Arabela, na casa que morei em BH. Deixei o Científico, que era um curso propedêutico, preparatório para uma faculdade, e decidi fazer o curso Normal, o Magistério. Matriculei-me no departamento feminino do Colégio Marconi, que passou a ser o Monte Calvário, que existe até hoje. E ali cursei o segundo e o terceiro ano do Magistério. Eu só vinha nas férias para Sacramento. Terminei o curso e, com 20 anos decidi me casar. Fiquei noiva e me casei com o José, a minha grande paixão. Eu falava pra ele: não me casei por amor, casei por paixão. Eu me apaixonei por ele! 

 

ET – Sabe que bem depois, quando o Zé Portella passava férias em Sacramento com você e os filhos, lá pelos anos 60, 70, nós jovens, éramos também apaixonados pela sua intelectualidade...

Hebe - O Zé era intelectual, um filósofo, um leitor compulsivo. Tinha um porte principesco, um lorde, sabia cativar. 

 

ET - Estudando fora, filha de um dos homens mais influentes do Triângulo, no ponto de vista político. Você foi política, ativista ou foi mais quietinha nessas questões?

Hebe  - Nunca fui quietinha! Eu era atuante, não aqui na cidade, mas em Belo Horizonte. A família do Zé era cheia de pessoas influentes e militantes no cenário político. Conheci muita gente. Conheci algumas mulheres marcantes como dona Naná, irmã de JK, casada com Júlio Soares, o primeiro presidente da Cemig. Eu frequentava muito a casa deles. Vi o nascer da Cemig na casa deles.  Conheci também dona Sara Kubistchek, sem falar que papai freqüentava muito o Palácio do Governo do Estado.

 

ET – E você sempre com ele...

Hebe - Sim, com papai. Nas suas idas a Belo Horizonte eu era sua motorista, dirigindo nossa Vemaguete. Eu o levava nas reuniões e, assim, fui frequentando o meio político. Uma das grandes emoções que tive, foi conhecer o Benedito Valadares, no hotel Normandy.  Eu e o Zé costumávamos almoçar lá com o Gustavo Capanema. Uma vez o Benedito Valadares foi à nossa mesa e, quando ele soube que eu era filha do Juca Sacramento, disse: “Ele me inspirou páginas do meu livro”. Imediatamente pediu ao secretário que lhe buscasse o livro, que se chama A Lua caiu e me presenteou. No livro, ele faz várias menções a papai. Conhecê-lo foi  pra mim um prêmio.   Com o papai aqui em Sacramento e eu lá costumava representa-lo nas festas. Papai telefonava e eu levava pessoas de Sacramento ao Palácio. No meio político era conhecida como uma embaixatriz da cidade na capital (risos).

 

ET - E Getúlio Vargas?

Hebe - Na eleição de Getúlio Vargas fiquei sem brinco, sem colar e tive minha blusa rasgada. Getúlio fez um comício na Praça da Estação e eu disse para o Zé que queria ir. Ele respondeu que era muita gente, mas mesmo assim fomos. Eu cheguei na beirada do  palanque para cumprimentá-lo e ganhei  um beijo. Mas era tanta gente, que voltei toda amassada. Mas ele ganhou (risos). 

 

ET - A Hebe mulher, a Hebe mãe, apaixonada por José Portela, tatuaria nas costas, “Haja o que hajar, sempre vou te amar”?

Hebe - Não. Sempre falei e falo para as minhas filhas que somos criaturas de Deus. Por que fazer uma coisa dessas? Admiro quem grava, delicadamente, o nome de um filho, mas com essas tatuagens grandes eu me escandalizo, principalmente aquelas no corpo inteiro. Isso me incomoda e muito. A gente grava essas coisas é dentro da gente. Eu brinco com meus filhos, dizendo: 'Eu não amo vocês, mas a vontade que tenho é de comê-los todos, porque os quero dentro de mim, nas minhas  entranhas, no coração'. Eles são pedaços de mim. É assim que eu os amo. Sei todas as qualidades que eles têm e quantos defeitos cada um tem, e aponto, e cobro e questiono. Mas nem por isso precisei tatuar seus nomes em meu corpo.

 

ET - Sendo hoje, o Dia das Mães, até que ponto você tem, na educação de seus filhos, a herança de sua mãe?

Hebe -  A presença no lar. Minha mãe nunca esteve do lado de fora para nos esperar. Sempre nos esperou do lado de dentro e ela fazia questão de agasalhar a todos e todos dormirem juntos. Ela não dormia enquanto não chegasse o último e não trancava porta. Aliás, a porta aqui de casa nunca estava trancada. Ela dormia aberta, naquela época podia. Outra coisa, todos os valores da cultura italiana que ela passou, eu passei para os meus filhos, desde a alimentação até as superstições. Hoje, eu falo na minha mãe com carinho, não com saudade, mas com um carinho de saber o quanto ela foi importante na minha vida, apesar dos meus complexos que eu superei já na idade adulta, já bem madura. 

 

ET – Que importância você dá à participação do pai na educação dos filhos... O Zé foi um pai presente nesse sentido?

Hebe – Totalmente! Isso é muito importante, por isso eu morro de dó, porque eu tenho netos sem o pai presente. Dó de não ver a figura paterna. O Zé foi marcante em tudo e por tudo. Pra começar, ele comprou um livro quando fiquei grávida da Carolina, nossa primeira filha, que fala sobre os cuidados com o bebê, com a seguinte dedicatória: “Ao meu bem,  para aprender a cuidar bem do nosso futuro bem”. Depois ele comprou, 'Liberdade sem medo', de Summerhill, que na época foi uma revolução.  Ele quase me matou, para por em mim aquele modo de criar, de educar do Summerhill, que é totalmente diferente de tudo o que eu tinha como base. O Zé se doutrinou naquilo, ele respeitava os jovens, ele apoiava, ele queria e foi chamado de professor. Aliás, ele termina sua carreira como professor. Com essa filosofia ele me ajudou e ajuda demais. Os filhos todos têm o maior respeito, a maior admiração e a maior saudade   dele. Eu tenho até inveja, porque eu sou daquelas mães bravas, eu cobro, eu exijo, eu falo... Mas uma coisa eu digo: agradeço a Deus todos os dias os filhos que tenho.  

 

ET - Alguma coisa que é fundamental na educação que sua mãe te ensinou, você ensinou para seus filhos e seus filhos estão ensinando para seus netos?

Hebe - O diálogo. Esse prazer de seu filho chegar, perguntar alguma coisa e você lhe responder. Você não deixa para depois. É na hora, mesmo que não tenha tempo. Mais importante que o diálogo é o respeito, não se pode perder o respeito.  Eu falo até hoje para meus filhos: 'Não me desrespeitem nunca'. Eu exijo isso. Sou de uma época em que não se fumava perto dos pais, não se contestava, nem se falava palavrão. 

 

ET -  Avó também educa? 

Hebe – Não diretamente. A avó para mim é testemunho de vida, é exemplo. Tenho dó das avós que assumem a responsabilidade dos pais, porque ela tem representação no lar, ela tem uma presença. Eu falo as verdades e digo-lhes que não é implicância, não, é conselho. 'Eu estou te alertando para a vida. Eu já vivi muito e posso te mostrar onde está a pedra no caminho. Ás vezes você nem vai passar por este caminho, mas estou te alertando'. Aí, ás vezes, eles vêm justificar e eu falo: 'Pssst, não estou perguntando o que você fez, não quero saber, estou só te alertando'. Uma coisa que me escandaliza é que várias meninas de hoje não sabem o sentido de duas palavrinhas: 'pudor' e 'recato'. É o cúmulo, pois tanto hoje como ontem, o que conduz, o que norteia uma jovem é o recato. Ela pode ser alegre, tatuada, sei lá, mas tem que ter recato, tem que gostar dela própria, se valorizar. Não pode se expor tanto. 

 

ET – Você foi filha, você foi mãe educadora ontem, e hoje avó... Olhando essas três gerações, acha que foi mais fácil criar os filhos no tempo de sua mãe, no seu tempo ou está sendo mais fácil agora com suas netas?

Hebe - É uma questão de cultura, mas acho que no meu tempo foi muito mais saudável, mais limpo.  Podem pensar o que quiserem, que tudo  era proibido, nada podia, mas nós saímos uma geração capaz de formar famílias. Formamos cidadãos honestos que levantaram o país. Sinto-me muito bem formada, porém entendo que cada época tem o seu preço, o seu peso, as dificuldades, mas  ainda assim acredito que, para minha mãe nos criar foi mais leve, mais fácil do que eu, como mãe, e do que as meninas hoje.  

 

ET – No seu tempo como mãe...

Hebe - A época em que eu criei os meus filhos foi dolorosa, foi de um tempo cheio de transformações  na sociedade, na cultura: revolução na educação,  na música, na política, tempo de hippies, da pílula anticoncepcional, de Summerhill... Agora, hoje,  nem se fala, porque o mundo evoluiu muito, as transformações se aceleram a cada dia e com os computadores, então, o que está aí nem entendemos, é uma outra realidade. Muito consumismo, violência, individualismo, drogas... todo tipo de excessos. As famílias têm que entender que o mundo não está mais lá longe, o mundo está dentro da casa de cada um, no colo de cada um, com seus tablets...

 

ET - Você é uma mulher carregada de fé, naturalmente herdada de seus pais. A formação religiosa é importante na educação dos filhos ou basta formar valores éticos, morais...?

 Hebe – A formação religiosa é de fundamental importância. Feliz da família, dos pais, que encaminham seus filhos nessa direção. Hoje, infelizmente, falta religião na educação dos filhos. Uma vez, eu disse ao meu pai que ia lhe mostrar os tratados do Vaticano II e ele não quis ver. Quando lhe perguntei o porquê, ele respondeu com a sabedoria herdada de sua mãe: 'Minha religião é minha mãe. Minha religião chama-se dona Ritinha'. E quando lhe perguntei se rezava, ele respondeu: 'Eu rezo o que  minha mãe me ensinou': “Com Deus eu me deito, com Deus eu me levanto, na graça de Deus e o Divino Espírito Santo. Nossa Senhora me cobre com o seu manto. Boa noite, meu Jesus! Boa noite, meu anjo da guarda e  toma conta de mim, da Mary, dos meus filhos, dos meus amigos e desse mundo de Deus. Amém!”. Meu pai tinha 90 anos quando me disse isso, coisa que ele aprendeu quando criança. 

 

ET - E quanto a você?

Hebe – Aprendi minha religião com a minha mãe, minha nona, dona Cesira e tia Arabela. Eu sou mulher de fé. Eu tenho uma religiosidade que me emociona, que me  faz caminhar até o outro. Eu trabalhei na CNBB do Leste II durante 30 anos, fui coordenadora de Cursilho por 25 anos, movimento de jovens, encontro de casal. Mas o mais importante foi o que aprendi no dia a dia, e me emociono, porque eu me sinto criatura de Deus. Por isso eu não vou me tatuar, porque sou linda, maravilhosa e poderosa. Linda, porque sou feita à imagem e semelhança de Deus; maravilhosa, porque Deus fez em mim maravilhas e poderosa, porque tudo posso Naquele que me fortalece. Agora, os meus filhos eu os iniciei na religião e graças a Deus, cada um guarda sua fé, uns mais, outros menos. Mal do lar que não tem uma religião, seja ela qual for. A religião é necessária na família e coloca em prática a máxima do Evangelho,  Amai-vos- uns aos outros.