“Levaram o meu Senhor, e eu não sei onde o puseram!” (Jo.20,12)
Neste dia 23 de dezembro de 2011 fez dez anos que o Sacrário foi afastado do centro da Igreja do Santíssimo Sacramento, em Sacramento, para que o lugar fosse ocupado pela cadeira do pároco, Padre Levi Fidélis Marques.
O fato merece lembrança e esclarecimento de como tudo se deu, porque acredito que, um dia, esse fato será escrito por clérigos e historiadores outros. Na minha visão de católico e historiador, foi o fato mais grave que se deu em toda a trajetória histórica de Sacramento. Portanto esta minha manifestação a faço, primeiro consciente, segundo porque a história precisa ser registrada e terceiro sem convite algum, a quem quer que seja, para pensar como eu. Um dia quando “os cegos virem e os mudos falarem” (Isaías-35, 5) eles vão proclamar a verdade. Esclareço que não tenho formação acadêmica em teologia, como me perguntaram. Mas sou um estudioso do tema, inclusive fui professor de “Cultura Teológica” na Faculdade Católica Rainha da Paz, de Mato Grosso (065 3261 1314). Esclareço isso para que não imaginem ser um fanático despreparado que escreve, não, posso até ser taxado disso, não me importo, mas sou uma pessoa que estuda e sou, sobretudo, honesto.
Sacramento foi fundada em 1820 como “Capela do Santíssimo Sacramento apresentado pelo Patrocínio de Maria” (conforme a ata da fundação onde a expressão “Santíssimo Sacramento” é repetida 53 vezes). A Vila foi formada em 1870, como “Vila do Santíssimo Sacramento”. A cidade foi instalada em 1876 com o nome de “Cidade do Santíssimo Sacramento”. A cidade de Sacramento se chamou assim até 1911, quando, na reforma federativa, o nome ficou somente “Sacramento”.
A paróquia de Sacramento foi criada com o nome de “Paróquia do Santíssimo Sacramento apresentado pelo Patrocínio de Maria” e esse nome, juridicamente e canonicamente, nunca foi mudado. Hoje dizem “Paróquia Nossa Senhora do Patrocínio do Santíssimo Sacramento” sem fundamentação histórica ou canônica. A cidade historicamente sempre foi e será do Santíssimo Sacramento. Desde o oratório de 1819 e a fundação da capela em 1820 observou-se o devido respeito ao Santíssimo Sacramento que ocupava o lugar central da igreja a Ele construída e a Ele dedicada.
O Poder Público também reverenciou “esse lugar central” do Santíssimo Sacramento, prova disso se estampa na bandeira e no brasão do município, criados por lei municipal em 1971. Nessas armas vê-se um “circulo branco central” que representa a Hóstia Consagrada, ou seja, o Santíssimo Sacramento. Por sobre o círculo branco uma estrela azul representando o manto protetor de Nossa Senhora sobre o município. No campo popular a música hoje nacionalmente cantada em que repetem: “Ó Deus salve o oratório, onde Deus fez sua morada...”, aqui teve origem, pois desde a fundação da cidade até a década de 1960, os moradores rurais ao avistarem a Igreja do Santíssimo Sacramento, diziam persignando-se: “Deus vos salve, lugar santo, de Jesus Santa Morada. No cálice bento do altar e na hóstia consagrada”. Era uma forma de oração para saudar o Augusto Padroeiro do lugar. Depois esses versos alterados ganharam o cancioneiro popular.
Registro essas passagens (poderia acrescentar outras) apenas para chamar a atenção do leitor para a gravidade do que se fez aqui em 2001. Naquele ano (em morava em Cáceres,MT, onde lecionava na Universidade do Estado) eu soube que o pároco de então, Padre Levi estava iniciando uma reforma na Igreja Matriz. Ele tinha todo o direito de fazer isso, muitos fizeram antes dele. Mas vim a Sacramento e o procurei juntamente com a professora Leida Araújo para me inteirar do que seria feito. Ele falou pouco ou quase nada, mas ouviu de mim uma explicação sobre a questão de fé e histórica e ainda um pedido: “Por favor não mexa na posição central do Sacrário, isso é sério demais frente a fé e a história do lugar”. Total mutismo da parte dele (ele já tinha em mente usar o lugar para sua cadeira). Retornei ao Mato Grosso preocupado com essa situação. Soube que outra pessoa, Dr. José Alberto Bernardes Borges, ex-prefeito e profundo conhecedor de nossa piedade e história também estava preocupado com isso. Retornei, mesmo sem poder, mais uma vez a Sacramento durante a reforma da igreja. Novamente procurei Pe. Levi e supliquei que não retirasse o Sacrário do centro da igreja. Total mutismo dele. De volta ao Mato Grosso, de lá escrevi duas cartas para ele suplicando que não tocasse na posição do Santíssimo Sacramento. Total mutismo. Daí então escrevi duas cartas ao arcebispo (tenho cópias de todas). Outro que não se dignou a responder. O jornal “O Estado do Triângulo” fez uma matéria sobre a insatisfação de pessoas com relação a mudança do sacrário e fez uma entrevista com o arcebispo. Ele reafirmou ao jornal que o Pe. Levi tinha o apoio dele para mudar o sacrário e que “um certo cidadão que ele não sabia o nome” andou escrevendo para ele. Disse ainda que nossa história era secundária à vontade do Pe. Levi.(!!!)
E foi assim que no dia 23 de dezembro de 2001, o Santíssimo Sacramento foi encostado no altar da Igreja Matriz para que o Pe. Levi Fidélis Marques pudesse se assentar no centro da Igreja. Colocou para um canto do altar o Deus Vivo e Verdadeiro presente na Hóstia Consagrada, o Santíssimo Sacramento e no seu lugar se assentou.
O arcebispo diante da revolta de pessoas teve o disparate de dizer no jornal que a cadeira representa o Cristo. Que absurdo! Retiram o Santíssimo Sacramento e reverenciam uma cadeira no lugar de Deus. Idólatras, hereges, um dia serão cobrados por isso. O homem, no princípio da criação também quis o lugar de Deus, foi expulso do paraíso e amaldiçoado, aqui recebeu as bênçãos do arcebispo. Ele sequer teve a dignidade de nomear uma comissão para avaliar os fatos, o que lamentamos muito. Depois fica pregando inculturação e caridade nos seus escritos públicos. Isso me faz lembrar o texto sagrado: “Esse povo me honra com os lábios, mas o coração está longe de mim”. (MT 15, 8-9).
Desde então, na Matriz do Santíssimo Sacramento, o Sacrário se encontra de lado, muitas vezes oculto por colunas, outras vezes, durante as missas, atrás dos ministros da Eucaristia (o que é terrível). Desde então venho, apoiado por poucas pessoas, tentando reverter o ato insano, mas isso não é possível enquanto estiver na Cátedra de Uberaba o arcebispo, Dom Aloísio Roque Oppermam (o grande agressor da nossa piedade e da nossa história, cujo nome, para mim, vai constar sempre no rol dos culpados). O pároco Pe. Levi já foi embora e o arcebispo se aposentando, e nossa piedade e história aviltadas por eles que nada fizeram para reparar o dano. Chegaram, mandaram, fizeram o estrago e foram embora, deixando apenas a revolta nos filhos do lugar. Agiram como assaltantes que, sem o mínimo respeito, adentram casa alheia, reviram gavetas e guardados, estupram e saem como se nada tivessem feito. Agiram como vândalos que não respeitam a história e a fé de um povo. Nossa luta continua e não é luta fácil. O publico, por falta de formação religiosa adequada, viu na inauguração a “beleza” da Igreja e bateu palmas para o homem, um Narciso coberto de vaidade, que atravessou o corredor da igreja e se assentou no lugar onde o Santíssimo Sacramento estava há 182 anos, e isso foi terrível. Não me importo com o que pensam e falam, mas atribuo toda desventura passada por essa cidade desde então a esse ato insano. É verdade que Deus não pune e nem se vinga, mas se afasta quando Ele é afastado. Isso a Bíblia nos revela em muitas passagens. Tomo por testemunhas as edições do jornal “O Estado do Triângulo” que, desde então, em quase toda matéria de capa nos traz um desastre, um crime ou uma desventura qualquer que a cidade passa. Podem dizer o que quiserem, atribuo isso ao “deslocamento” do centro...a cidade perdeu o centro... o equilíbrio foi mexido...as coisas estão fora do nível...só não vê quem não quer. Só não vê quem não quer a tristeza que parece pairar sobre esse lugar. Pessoas que passam por aqui notam isso. Mas um dia, os clérigos escreverão sobre isso. Quem viver, verá.
Lamento que pessoas que poderiam ter somado forças comigo se bandearam para o lado contrário, simplesmente por serem mambembes de sacristia. Enfrentei beatas e beatos, incensadores de cadeira. Enfrentei até a malquerença e maledicência de uma pessoa que na minha infância e juventude eu imaginava ser um ícone de amor e bondade. Por respeito à sua figura, abaixei a cabeça e silenciei diante de suas falas ferinas. Deus olhará por isso, porque jamais busquei minha glória pessoal nesse assunto e, mil vezes, me sentiria melhor se não tivesse que escrever o que, há dez anos, venho fazendo.
Um dia meu povo vai acordar e ver o que de triste passamos com essa atitude insana do pároco, do arcebispo e dos mambembes de sacristia que apoiaram o ato. Quanto a eles restam, na minha visão, o julgamento de seus atos e o desprezo da história.
Por Amir Salomão Jacób