Que pena Lemir Feliciano de Deus ter morrido numa UTI. Queria uma notícia de sua passagem como se estivesse sendo alçado para os braços do Pai de debaixo de uma castanheira, emoldurada à volta pela beleza exuberante da Amazônia, cenário de mais da metade de sua vida.
Lembro muito de Lemir. Moleque, engraxate do Bar do Ledo, às vezes servia como menino de recado de meu pai, ainda antes da Telefônica de Sacramento. Nessas idas e vindas de pequenos favores, foram várias as idas ao Bar e Mercearia Leise, de seu pai, Langerton Feliciano de Deus, único representante da famosa marca Antarctica na cidade. “Papai pediu para o Sr. mandar dois engradados de guaraná e um de cerveja”, dizia eu, vendo aqueles meninos brincar por ali.r.
Mas amigo mesmo dele foi meu irmão, Toninho. Ambos formados engenheiros, a vida toda trocavam figurinhas das obras em que cada um trabalhava. Logo que foi para o Norte, onde construiu uma grande empresa, convidou o amigo, mas acabou não dando certo. Toninho foi para a Vale, na serra dos Carajás, e Lemir mais próximo a Belém.
Homem de visão, inteligente, já com a empresa estruturada, colocando em prática o grande amor que mantinha pela cidade natal, Lemir nutre o desejo de fazer algo por sua terra, colocar na prática os grandes ideais que sonhava para o progresso e desenvolvimento de sua inesquecível Sacramento.
Alimentando esse sonho, lança-se candidato em 1988 pelo PDC de Luiz Rodrigues, contra três outros fortes candidatos. Por 61 votos perde para José Alberto, outro gigante da política naqueles idos, que iniciaria seu terceiro mandato. Atrás, ficaram Paulo de Tarso, pelo fortíssimo PMDB e Berto Cerchi, pelo recém criado PT.
Idealista, sonhador, verdadeiro são virtudes que nas eleições não fazem muito efeito no Brasil de hoje... Como diz Caio Blinder, “Políticos costumam ser eleitos não pela defesa do argumento correto e sim pela venda eficiente de ilusões”. E o filho do Seu Langertom jamais venderia ilusões.
Ainda alimentando os antigos sonhos aceita um convite do ex-prefeito Biro para compor uma chapa com ele nas eleições de 1996. Eleitos, o secretário de Obras foi meu irmão, Toninho, que já morava por essas bandas. Um trio de ouro! Na capacidade, no dom de servir e na amizade. Foram quatro anos de governo que Sacramento jamais viu.
Nas eleições seguintes, nas dissidências e rixas políticas comuns entre os homens que se enveredam por esse caminho, rompe politicamente com Biro. Pessoalmente, a amizade que nos unia foi também abalada por um comentário que fiz no ET, denominando de 'carta burra' um manifesto que Lemir fez em apoio a um candidato adversário. Que pena, nunca mais tivemos os papos alegres cheios de risada.
Mas guardei a para sempre a imagem querida do filho do Seu Langerton e de Da. Norma, o filho inteligente, estudioso, o marido cheio de ternura e amor para com a inesquecível Célia, o pai devotado e carinhoso de Sarinha e Saulo, o político que ainda acreditava em valores, o grande empresário que se transformou tecendo e construindo histórias no Norte. Repito aqui a frase que a repórter Maria Elena ouviu: “Tem gente que nasce para brilhar em outro lugar”.
Não morreu debaixo de uma castanheira, mas tombou como um forte. E viver por isso, vale a pena. Que o Pai, Célia e Toninho o recebam de braços abertos. (WJS)