Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Tempo de Libertação

Edição n° 1216 - 30 Julho 2010

Às vezes me questiono como consegui passar pela jovialidade da adolescência e início da vida adulta, de forma incólume, sem me adentrar pelo sedutor, porém cortante e obscuro caminho das drogas.

Seria por formação familiar ou por amparo de espíritos de luz que se colocam como guardiões invisíveis da vida, bem sublime nos dado pela bondade que é Deus?

Não creio ser tão merecedor da segunda opção, visto que peço e recebo muito mais do que faço por merecer, apesar de já ter sentido este amparo espiritual.

Quanto à primeira opção, sem demagogia ou falso pudor, indubitavelmente posso dar o testemunho que, no meu caso, foi imprescindível para que me mantivesse afastado das drogas, pois, o simples pensar em usá-las, causava em mim uma sensação de traição, era como se estivesse prestes a dar as costas a tudo aquilo que sempre defenderam meus pais. Seria como negar a minha própria essência, rasgando o norte da minha própria consciência.

Triste é constatarmos que, muitas vezes, a ausência dessa relação familiar, o vazio martirizante nos corações de crianças e adolescentes pela falta justamente deste vínculo sadio entre pais e filhos, transforma-se em válvula de escape e terreno fértil para a germinação da podre e ilusionista sensação proporcionada pelo uso das drogas. E não é só isso, pessoas bem criadas, que tiveram toda assistência familiar, também se perdem pelo caminho de difícil retorno das drogas, visto que existem outros fatores presentes na sociedade que fogem do alcance dos pais e da família, como: a curiosidade, a impetuosidade da juventude, a sensação de “poder” e liberdade do adolescente que se sente indestrutível e dono de qualquer situação quando faz uso das substâncias entorpecentes, a vontade de não ser diferente nem discriminado pelos amigos usuários, tudo isso são portas largas de acesso ao vício.

Quantos corações ainda serão partidos? Quantas mães ainda chorarão de dor pela fenda perene da alma causada pela ausência dos filhos, cujo tempo não consegue fechar?

Grandes potenciais estão sendo perdidos, pessoas boas, sejam de famílias tradicionais, sejam jovens talentos que não puderam desabrochar sufocados que foram pela cruel realidade em que vivem, realidade da falta de oportunidade de quase tudo e de perspectiva de melhoramento de vida.

Já é por demais cientificamente sabido, que os efeitos das drogas podem variar de organismo para organismo, ou seja, algumas pessoas estão sujeitas a se viciarem mais rápido do que outras, assim como algumas têm mais facilidade, ou melhor, menos dificuldade de se libertarem do vício. A única certeza é que a luta é incomensuravelmente difícil.

Em tempos outros, vivera aqui um jovem amigo. Inteligente, espirituoso, fazia um enorme sucesso com as mulheres. Uma pessoa boa, alma generosa, mas que se transformava em rebeldia e acorrentava aquele que não conseguia responder às suas elucubrações, e desferia, sem piedade, chibatadas cortantes na carne nua, chutes, socos e vidros estilhaçados e, já cansado de tanto bater, levantava-se e olhava-se no espelho e via o próprio rosto desfigurado e, então, por um momento, tinha consciência do auto-flagelo que cometera – só fizera mal a si mesmo.

Se a vida é transformação, mudança, e resultado das escolhas dos caminhos percorridos; pertinente lembrarmos que o mal, um dia, também foi do bem, mas que se deixou levar pela inveja. Amparados na esperança e na bondade que é Deus, rezemos para que todos os jovens que se encontram perdidos no vale das drogas, possam retornar na gênese da vida e renascerem como anjos que sempre foram, pois, sempre haverá tempo de libertação.