Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Como Cônego Hermógenes sonhou

Edição nº 1208 - 04 Junho 2010

Conheço essa imagem de Nossa Senhora do Patrocínio do Santíssimo Sacramento desde que nasci, e isso já faz um bom tempo, graças a Deus. No meu tempo de criança ela ficava no fundo da Igreja, atrás do altar-mor, num pedestal alto, abaixo do vitral que a reproduzia. Com a reforma de 1971 ela ficou um pouco mais destacada: veio para o presbitério, sempre do lado direito do Santíssimo Sacramento, sob um baldaquino. Em 2001 foi colocada à esquerda, como ainda se encontra. Seria mais uma imagem de Maria, das milhares e milhares esparramadas pela face da terra, se não fosse única. Única em todo o mundo, tanto no talhe da escultura, como no título que carrega: Nossa Senhora do Patrocínio do Santíssimo Sacramento.

Muito criança, lembro-me do regozijo popular quando, sobre a cúpula da Igreja recém reformada, colocaram uma réplica de sua imagem, em 1958. Aplaudi de perto sua coroação oficial em 1981, pois estava ao lado do prefeito, Dr. José Alberto B. Borges, que a coroou. Participei da primeira procissão e missa oficial naquele dia 31 de maio de 1981. Participei como secretário do prefeito, da formação da Lei 173, de 12 de outubro de 1980, que a proclamou, oficialmente, Padroeira do município de Sacramento. Cantei junto com o pequeno coral montado pela saudosa Irmã Maria Benigna de Jesus Martins, os primeiros acordes do hino que a religiosa havia composto em sua honra. Hino que ainda se canta em suas festas. Vi quando apresentaram pela primeira vez a Bandeira de Sacramento com faixas e estrela azuis, em 1971, para simbolizar seu manto protetor. Vi ainda, na mesma data, o professorado da Escola Estadual Afonso Pena Júnior lhe oferecer, pelas mãos da saudosa diretora Adail Araújo, o par de brincos que ainda ostenta.

Escrevi em 1978 um livro para contar a história de sua igreja e de sua imagem. Lamentei, publicamente, a agressão artística que lhe deram em 2004, quando mãos inabilitadas macularam suas feições maternais. Nos 12 anos que morei fora de Sacramento, quando aqui aportava em férias ou feriados, primeiramente a visitava, na Matriz. Ajoelhado diante de sua imagem, mão sobre o coração, rezava-lhe uma Salve Rainha; procedimento que tinha um dia antes de voltar para longe de minha terra. Nunca me ausentei de Sacramento sem antes voltar o olhar, ainda que de longe, para sua imagem sobre a Igreja Matriz e pedir a graça de retornar.

Enfim, conheço e reverencio como poucos essa imagem sagrada de Nossa Senhora do Patrocínio do Santíssimo Sacramento. Só que, nunca a tinha visto tão bela, tão garbosa, tão elevada, tão radiante, tão misteriosa, tão feliz, tão senhora de si, tão glorificada, tão exultante como na procissão do último dia 31 de maio.

Nessa procissão Ela não estava só.  Aquele que o universo não pode conter estava contido em suas Mãos Imaculadas.

Foi-lhe dado o seu direito exclusivo de levar nas mãos o próprio Deus na figura do pão. Foi-lhe tirado carregar o simbolismo de uma custódia oca, mas o mesmo Senhor que Ela, um dia, na Judéia, levou no seu ventre sagrado. No receptáculo da custódia foi colocado o Santíssimo Sacramento, razão única de nossa fé católica. Confesso que me emocionei profundamente quando vi o pároco, Pe. Valmir Ribeiro, diante das autoridades e do povo de Sacramento, colocar a hóstia consagrada nas mãos da Virgem Santíssima, padroeira de nossa terra.

Vi no ato daquele homem a concretização do sonho do fundador, Cônego Hermógenes que, ao fundar a cidade em 24 de agosto de 1820, a fundou como “Capela do Santíssimo Sacramento apresentado pelo Patrocínio de Maria”. Esse foi o seu desejo: Em Sacramento, quem apresenta ao povo o Santíssimo Sacramento é a Virgem Imaculada. Isto se deu na fundação da cidade e repetiu-se no último dia 31 quando, concretamente, a Virgem apresentou ao povo o Santíssimo Sacramento.

Esse gesto não pode nunca ser esquecido. Registre-o as memórias, as atas da Câmara Municipal, os apontamentos dos Livros de Tombo e as páginas de jornais da imprensa local. Foi o ato mais significativo que poderíamos ter neste ano em que se comemoram os 190 anos da Capela do Santíssimo Sacramento apresentado pelo Patrocínio de Maria.

Fiz questão de carregar o andor da Santíssima Virgem, que levava em suas mãos o Santíssimo Sacramento. Cruzei a ponte do ribeirão Borá sob o peso daquele andor e refleti o momento histórico que vivia: o Santíssimo Sacramento, a Virgem Imaculada e o Ribeirão Borá, preciosidades citadas na ata da fundação da cidade.

Prezado Padre Valmir, Hermógenes do século XXI, seu gesto de amor, seu alto interesse pela história de Sacramento, sua piedade, seu dinamismo, sua extrema simpatia o colocam também como sinal de Deus nestas terras do Santíssimo Sacramento apresentado pelo Patrocínio de Maria. Que Deus o conserve!

Laus Deo et Mariae!

 

Amir Salomão Jacob