Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Personalidades do Ano Frei Pedro e Orlando Silva

O Mosteiro Santa Maria dos Anjos na Providência de Deus completa dois anos de funcionamento em Sacramento. No dia 25 de fevereiro de 2004 os franciscanos assumiram a casa, onde durante mais de 30 anos abrigou os padres e seminaristas da Congregação Redentorista.

A nova casa é o único mosteiro da Fraternidade de São Francisco de Assis na Providência de Deus . É lá que os freis se dedicam à contemplação e oração. Mas o prédio presta também a um trabalho social maravilhoso, o Educandário do Ssmo. Redentor, atendendo a mais de 130 menores, com idade de 7 a 14 anos.

Ao fazer uma análise desses dois anos de trabalho social realizado pelo Educandário, o superior da casa, Frei Pedro Caetano da Silva, 54, disse que a experiência foi positiva. “2004 foi o ano da experiência, era o início de um novo trabalho dentro do nosso carisma. Em 2005 não aumentamos muito as crianças, melhoramos a qualidade no atendimento das 130 crianças, coordenadas pelo frei Domingos Pereira e Irmã Idalina, da Congregação de São José de Cluny. E valeu a pena, porque nesses dois anos vimos crianças que eram desacreditadas, não sendo aceitas nem mesmo pelas escolas, hoje são bons alunos, alguns estão trabalhando, produzindo, em casa são bons filhos, conforme relatam os próprios pais, eles não estão sendo problemas, mas solução. Cumprimos a nossa missão. O nosso diploma está aí", avaliou.

O trabalho com crianças tanto deu certo que a Fraternidade assumiu mais uma casa de menores. "Dessa experiência ganhamos força e coragem para iniciar um outro trabalho. A Fraternidade assumiu uma casa em Pirajuí (SP). E com isso o Educandário Santíssimo Redentor perdeu o Frei Domingos Pereira, que atendeu a um novo chamado para assumir a direção daquela casa”, informou Frei Pedro, ressaltando, entretanto, que a comunidade ganhou dois novos religiosos, Frei Domingos Sávio e Frei Lourenço. A coordenação da casa, a partir deste ano, ficará com irmã Célia, da congregação de São José de Cluny".

Para 2006, o Educandário continua atendendo a 130 crianças. “Vamos continuar investindo na qualidade do trabalho dessas 130 crianças e adolescentes, mas se aparecerem outras, vamos recebe-las. Continuaremos o trabalho pedagógico, através do reforço escolar, além de outras atividades práticas e culturais, como oficina de artesanato e pintura; prática de esportes; música, com a Orquestra Sinfônica João Magnabosco; dança, teatro, karatê e outras, além das atividades de lazer".

Frei Pedro: humildade e doação

À frente do Mosteiro está o guardião, frei Pedro Caetano da Silva, 54, natural de Itaperuna (RJ), que niciou a vida religiosa na Fraternidade São Francisco de Assis na Providência de Deus, em março de 1988. "Antes eu trabalava na coordenação de comunidades eclesiais de base, Ceb's, em Rondônia. O bispo na época era Dom Geraldo e ele deu um enfoque grande nas Ceb's. Com os padres formávamos até 100 comunidades dentro de uma paróquia. Acho que foi esse trabalho que me despertou para a vida monástica e eis-me aqui servindo a São Francisco desde 2004".
Falando um pouco da formação dos franciscanos, frei Pedro explicou. "Quando ingressamos na Fraternidade, passamos por estudos básicos, estudamos o franciscanismo e, a partir do momento que professamos os votos, podemos escolher cursos que nos favoreçam dentro do nosso carisma: enfermagem, odontologia, magistério, administração hospitalar. Enfim, a pessoa pode escolher qualquer curso que possa ser usado em favor do carisma da Fraternidade. Aqueles que têm vocação para o sacerdócio vão para filosofia, depois teologia até tornarem-se presbíteros", explicou.

Prosseguindo, acrescentou uma bonita mensagem sobre o carisma da Fraternidade: “Estamos a serviço dos leprosos do nosso tempo. Na época de São Francisco (1182/1226) eram leprosos mesmo e não tinham cura, a não ser por um milagre de Deus. Hoje, a lepra tem cura, o que não tem cura hoje são as drogas, a violência e nós nascemos para isso, para atender os leprosos do século XXI, por isso nascemos de uma casa de recuperação de drogados. Hoje, os atendemos não só nas casas, mas também a nível ambulatorial com centro de triagem e diagnóstico", informou.

A Fraternidade de São Francisco de Assis conta, atualmente, com oito ambulatórios; oito casas de recuperação de drogados, destinadas a maiores, menores e mulheres; um hospital para deficientes com paralisia cerebral sem condições de recuperação, em Pirajuí; um hospital em Andiara; dois hospitais em Jaci, sendo um para deficientes com paralisia cerebral; um hospital em Aparecida; um hospital, em Mirassol; um hospital geriátrico, em Rio Preto; um albergue, em Lins; e o restaurante Bom Prato, em Rio Preto, que fornece 1.200 refeições por dia, a R$ 1,00. "Tudo isso conseguido graças à Divina Providência", finaliza Frei Pedro.
Por todo o trabalho que a Fraternidade São Francisco de Assis na Providencia de Deus realiza no Estado de São Paulo e em Sacramento, pela doação e desprendimentos dos freis, através de Frei Pedro e Frei Domingos, os franciscanos são Personalidades do Ano de 2006.

Orlando da Lojinha Tradição no comércio Sacramentano

Orlando Augusto da Silva nasceu no histórico Desemboque, berço do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, em 8 de agosto de 1924. Segundo filho do casal, Agustinho José da Silva e Maria Francisca da Conceição, veio fazer companhia para a irmã, Ubaldina (Fiica) e, depois ganhou outros oito irmãos, Maria Aparecida (Negrinha), Hilda, Ilmo (Nego), Renan, Augusta, Marta, Leusa e Eurípedes. Vida difícil a da família de Agustinho e Maria. Conta Orlando que as lides começaram com o pesado trabalho rural. "Muitos anos na enxada, capinei muito, até que papai abrisse uma venda. Lá a gente vendia tudo, até pano, o famoso brim 'arranca toco', brim aço e algodão. A gente buscava os panos na Loja São Geraldo, em Uberaba", recorda.

A infância e adolescência foram vividas entre os povoados de Desemboque, Guaxima e Bananal. Eram tempos de guerra. O mundo assistia atônito à 2a Guerra Mundial. Em 1944 o jovem Orlando foi convocado para servir o exército em Itajubá (MG), onde permanece até 1947.

O grande amor

Retornando de Itajubá, Orlando casou-se em 15 de setembro de 1947 com Euripedina Maria. "Casei-me numa segunda-feira, às três horas da tarde. O meu sogro era meu padrinho. Meu pai falou pra eu casar com a Euripa. Ela tinha 16 anos. Acertado o casamento, meu padrinho marcou para junho e eu pulei fora dessa data e marquei para 15 de setembro. E casamos. O juiz de paz era o Emilio Ribeiro da Silva e o escrivão, José Horácio Machado. Foi um festão. Tinha doce de leite, biscoito, comida e muita sanfona a noite inteira. Daí uns dias, ela botou as roupinhas dela, num saquinho de sal e fomos a pé para o Bananal. Depois fomos para o Quenta Sol", recorda.

O belo casamento que já dura 58 anos rendeu a Orlando e Euripa, os filhos, Airton (Maria José), Neide (Herbert), Marisa (José Arruda), Anderson (Maria da Graça), Nilson (Meire) e Marleida (Jose Alexandre), 18 netos e dois bisnetos.

O comerciante Orlando

Em maio de 1948, Orlando pega a mulher, vem pra cidade e inicia a vida no comércio. "Abri uma lojinha, no prédio da esquina da rua São Pedro com a praça Getulio Vargas, ali onde morou o Sussu. Tinha uma portinha, onde abri a loja, Casa Vitória. Só que todos a chamavam de 'Lojinha, a Lojinha dos Canhotos', porque eu e meus irmãos que trabalhavam comigo, éramos os três canhotos. Um dia retirei a placa e ficou 'A Lojinha' e nunca mais pus uma placa. Esse nome, A Lojinha, Deus abençoou, pois vendi pano demais nesses 57 anos", conta satisfeito ao recordar o tempo.

A Lojinha passou por vários endereços para a avenida Rio Branco, onde funcionava a Loja Guanabara, onde funciona hoje, o Supermercado Dois Irmãos, e outros. Era o começo da vida de um comerciante que pautou a sua via, desde a pequena 'Lojinha' na praça da Matriz aos últimos e modernos prédios, na honestidade, ética e respeito para com os clientes. Diz que nunca cobrou juros de seus devedores. E assim veio ganhando a simpatia da população e clientes não lhe faltaram nunca.

Graças ao seu tino administrativo e muito trabalho, como não podia ser diferente, começou a prosperar. Adquiriu a primeira casa, a casa da Militina. Em 1967, Orlando constrói a sua primeira casa, onde reside o filho, Airton Silva, na Antonio Carlos. "Foi uma luta pra fazer aquela casa, faltava dinheiro, mas consegui", lembrou. Em 1976, iniciou a construção do moderno prédio, na esquina da Capitão Borges com a Vigário Paixão. "Mudei a loja em 1978 e lá fiquei até 31 de julho de 2001", contou. Nessa data separou a sociedade com seu filho Nilson, que permaneceu no prédio com a Stock Tecidos, e 'Seu' Orlando muda com A Lojinha para outro grande prédio que construiu em outra esquina, Capitão Borges com Antonio Carlos.

O último prédio construído, do pequeno patrimônio que construiu, diz o simpático comerciante, foi o sobrado onde mora atualmente. "Quando construí a loja na esquina da vigário Paixão, Euripa não gostou de morar lá, queria uma casa no chão. Aí comprei o terreno que era o depósito de cal do Jácomo Pavanelli. Era pequeno, 9x13, mas ela queria uma casa pequena. Aqui construí nossa casinha, aqui vamos acabar nossos dias", disse, mostrando com a esposa a funcionalidade da pequena casa.

Em 2005, mais uma vez, mostrando que dedicou a vida para os filhos, 'Seu' Orlando passou A Lojinha à filha Neide. Podia viver da aposentadoria e dos aluguéis, mas esse trabalhador inveterado não quis. No mesmo prédio, adaptou um pequeno cômodo e aos 80 anos inaugurou a 'Casa Nova'. "Na Casa Nova só tem o proprietário velho, o resto é tudo novo. Não vendo tecidos, só confecções. Estou começando uma nova etapa. O comércio está no meu sangue", disse alegre ao lado da esposa.

A lição de vida

No auge dos 81 anos, Orlando dá lições de vida. "Sou analfabeto, aprendi a somar e assinar o nome. Minha Euripa também o é, mas estudamos os filhos todos. Agradecer é pouco. São tantas coisas que tenho que agradecer que é pouco. De onde eu vim, aonde cheguei não tem explicação. Agradecer é pouco, eu teria que dar a vida. Minha vida foi linda. Quando completei oitenta anos, pedi mais vinte, e vou pedir de dez em dez, porque se eu viver 200 anos vai ser pouco para agradecer, porque recebi muito da vida. A primeira vez que calcei uma botina foi de número 39, a gente usava 'precata" de couro, que a gente mesmo fazia. Depois meu pé passou pra 40 e parou de crescer", contou mais, emocionado.

Falando de sua personalidade forte, ressalta sua honestidade. "Sou trabalhador, mas não sou bonzinho. Tenho muitos defeitos, mas uma coisa sempre tive sou correto, honesto. O que é meu é meu, o dos outros não me pertence. Nunca cobrei juros de nenhum freguês, aprendi isso com um turco, na 25 de Março, em São Paulo. O Sr. Aghi Abbud, me arrumou a mercadoria. Comprei um cheque, calculei os juros e mandei pra ele. Quando fui lá, ele me disse: 'Não, filho, juros é contra as leis de Deus". Então eu nunca cobrei juros e sempre vendi a prazo. O dia que o freguês pagasse era aquele preço", explicou.

O segredo do sucesso

Para Orlando não há segredo para o seu sucesso. "Não tem segredo pra isso, para mim o cliente é nota mil. Todo respeito, atenção é pouco para um cliente. Vem um cliente lá da roça, ele quer atenção, respeito. Hoje, muitos clientes da roça vêm à cidade e vêm me visitar, é gente de canto a canto", disse mais, recordando-se das capas de chuva, 'Renner' e 'Ideal', próprias para boiadeiros, e os famosos chapéus 'Ramenzoni'. "Mas eu vendia de tudo, desde tecidos grosseiros a tecidos finos, as famosas capas de chuva Ideal a chapéu. Vendi muita capa e chapéu pro pessoal da zona rural. Mas já vendi até calçados. E tem um fato engraçado, uma vez veio uma caixa com os sapatos, os dois do mesmo pé. Deixei lá e um dia chegou uma mulher, que perdera um pé em um acidente. E foi incrível, aquela caixa continha exatamente o número que ela calçava. Aí dei os dois sapatos para ela, nunca me esqueci disso", recordou, reafirmando: "Não existe segredo, é só trabalhar com respeito e fé em Deus. Crise? Não sei o que é crise. Crise é a gente que faz", finalizou.