Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

O Turismólogo, Samuel Pucci...

Das diferentes profissões criadas recentemente, para atender a demanda emergente de um novo mercado de trabalho, o jovem sacramentano, Samuel de Souza Pucci, 28, abraçou uma delas. Samuel é turismólogo, formado na primeira turma da Faculdade de Turismo Anhembi Morumbi, a primeira faculdade a abrir o curso no Brasil, por sinal de altíssimo nível. Após a formatura em 2001, no ano seguinte, Samuel seguiu para a Inglaterra para especialização em Hotelaria e a partir daí não parou mais de trabalhar: o primeiro emprego foi em Michigan, nos Estados Unidos, com a empresa mexicana de hotelaria, Posadas, o maior grupo hoteleiro da América Latina, proprietária da rede Caesar Park. “No México, o desenvolvimento turístico é muito grande, apesar de serem um dos maiores produtores de petróleo, suas maiores divisas provêm do Turismo, aliás, com exceção do Brasil, todos os demais países economicamente desenvolvidos investem alto em Turismo”, comenta.

A opção por Turismo...

Por pouco Samuel não seria mais um advogado no Brasil, a mudança de opção veio de repente. “Estudei em Sacramento até a Oitava série, mudei-me para Uberaba, depois para Ribeirão Preto e toda minha formação era voltada para o Direito. Mas, de repente, houve uma abertura muito grande para o Turismo. Aliás, eu já havia feito vestibular para Direito, mas decidi que não era aquilo que eu queria. Lembro exatamente o dia que, na sala lá de casa, contei para os meus pais. Meu pai me deu a maior força, minha mãe, mais conservadora, em princípio, não gostou da decisão, mas depois me deu apoio. Fui para São Paulo e ingressei na primeira faculdade de turismo do Brasil, Anhembi Morumbi, que hoje é referência na área de Turismo e Hotelaria. Hoje eu sei que estava no caminho certo, apesar de que, no Brasil, o Turismo esteja engatinhando”.

O curso de Turismo e Hotelaria

A expansão dos cursos de turismo foi grande nos dois últimos anos, mas na opinião de Samuel falta estrutura na maioria dos cursos, além disso, o campo é limitado devido a falta de incentivo ao setor. “Atualmente, no Brasil, quem se forma em Turismo não tem campo de trabalho, o comum é trabalhar em outras áreas”, afirma. “Quando eu concluí o curso havia no Brasil menos de 20 faculdades, hoje são mais de 400. A aprovação desse imenso número de novos cursos de turismo em tão pouco tempo foi uma irresponsabilidade do MEC. As universidades não estavam preparadas para a abertura destes cursos, não possuem professores qualificados, as grades curriculares são mal elaboradas. Conseqüência: profissionais com péssima formação, despreparados e desmotivados. Para Samuel, uma boa faculdade de Turismo deve ter: hotel-escola, restaurante-escola, centro gastronômico-escola, agência de viagem-escola sempre buscando a junção teoria e prática. Além disso, deve conter na grade curricular o ensino de três idiomas, uma vastíssima biblioteca com informações de todo mundo.” O pessoal tem que sair qualificado, porque a disputa é grande e há poucos bons profissionais no país. Há também poucos grandes empregos na área no Brasil e faz falta, porque o turista é um consumidor extremamente exigente. Ele paga para que tudo corra na mais perfeita ordem. Ser turista é fácil; difícil é a atividade preparatória dos que pretendem capacitar-se para exercer as tarefas que garantem um turismo de melhor nível para turistas de todos os níveis”, conta, exemplificando com experiências vividas nos Estados Unidos.

O Turismo no Brasil

Para Samuel, o Turismo no Brasil ainda está engatinhando em relação ao resto do mundo. “Não dá para fazer uma comparação, mas um dado básico que temos é que o Brasil recebe 5,4 milhões de turistas por ano, enquanto a França recebe 76 milhões e os Estados Unidos 50 milhões de turistas por ano”, diz, mostrando o que falta no Brasil:” A primeira iniciativa é de interesse público, porque a base é pública, depois é que entra a iniciativa privada, lembrando que deve haver sempre a sintonia entre os dois setores, pois são interdependentes. O governo Lula criou o Ministério do Turismo, profissionalizou a EMBRATUR e estabeleceu um novo Plano Nacional de Turismo, que se fosse seguido, tornaria o Setor de Turismo, a maior divisa de capitais para o Brasil, superando as maiores exportações atuais. O Plano instituiu como meta a geração de 8 bilhões de dólares, o aumento para 9 milhões de turistas estrangeiros, geração de 1,2 milhões de novos empregos diretos e elevação para 65 milhões a chegada de novos passageiros nos vôos domésticos, mas falhou... Houve muitos erros, o principal foi regionalizar o turismo, descaracterizando assim a individualidade e vocação turística de cada município. Além disso, o governo não modificou a legislação que favoreça a atividade turística, como por exemplo, a permissão dos cruzeiros marítimos na costa brasileira, atividade em constante expansão.
O país precisa visualizar que o turismo é uma das maiores indústrias, uma indústria sem chaminés”, explica. Fonte inesgotável de benefícios econômicos, permitindo a multiplicação de bens e serviços variados em quantidade incalculável. O produto turístico é sempre único e diferenciado, ao contrário de outros produtos industrializados, que é produzido em série e jamais único.

O momento do setor no Brasil passa por dificuldades. Com falências em séries de empresas turísticas, Stella Barros, Soletur e agora VARIG, que eram propagandas pra fora do país, gerado pelo fatídico 11 de setembro. Faltou subsídio e planejamento do governo, como ocorreu noutros países. Países menores que o Brasil, investem oito vezes mais em marketing turístico. Fora daqui ninguém conhece o Brasil, ou conhece a violência, o turismo sexual. Infelizmente, não há uma divulgação do país lá fora, responsabilidade da EMBRATUR”, esclarece.

Benefícios do Turismo

O sucesso de um bom planejamento turístico é revertido em vantagens que refletem das mais variadas formas. O emprego de mão-de-obra em geral ocupada na produção de bens e serviços aumentará consideravelmente, fazendo crescer a rentabilidade de famílias de menor poder aquisitivo. A necessidade de mão-de-obra especializada, com a prestação de serviços diretos ao consumidor como guias, recepcionistas, recreacionistas, etc., incentivará a população local a se profissionalizar. Com a movimentação dos turistas, o setor gastronômico, como restaurantes e lanchonetes terão a oportunidade de expandir seus empreendimentos e trará a possibilidade da criação de novos estabelecimentos. Além disso, o transporte coletivo deverá se modernizar o que favorecerá não só os visitantes, mas também os próprios moradores. Com a implantação e aperfeiçoamento do setor hoteleiro, haverá a geração de empregos e a movimentação do comércio devido aos produtos que os hotéis precisarão para atender aos hóspedes, além do movimento decorrente dos turistas que circularão pela cidade em busca de presentes, lembranças, artesanatos entre outras curiosidades. A inauguração de novos entretenimentos, que são essenciais para preencher a estada do turista na cidade, beneficiará também a população local. A concorrência que se estabelecerá entre as empresas será benéfica, porque o aumento da produção de bens e serviços estimulará a competitividade entre os elementos da oferta, melhorando a qualidade dos serviços.

As Estruturas Básicas

Segundo Samuel, para se desenvolver o turismo são necessárias duas infra-estruturas: geral e turística. O setor público tem por obrigação e por missão investir na infra-estrutura geral (geração e fornecimento de água, eletricidade, serviços de esgoto, telecomunicações, rede viária) e todos os demais serviços em qualidades mínimas exigíveis para a efetivação de graduação razoável e necessária para que o núcleo local, regional ou nacional possa ser classificado como urbanístico em suas instalações. Já o setor privado é responsável pela infra-estrutura turística (equipamentos receptivos e de agenciamento, instalações de hospedagem, restaurantes, eventos, áreas de lazer, atrativos, etc.). Nos lugares onde há equipamentos satisfatórios, o setor privado está investindo. Sempre aparece alguém construindo uma pousada, um hotel. Mas em lugares onde não há qualquer tipo de investimento público, é muito perigoso o investidor privado se arriscar. Então, deve haver sintonia entre os setores. O setor turístico oferece oportunidades de boas alternativas aos empresários que nele investem ou desejam investir, desde que planejem com critérios e se estabeleçam em locais convenientes, tanto pela qualidade de oferta e suas especificidades quanto pelo volume da demanda. O sucesso, no entanto, depende muito da qualificação do potencial, dos equipamentos e dos serviços oferecidos ou à disposição do público.

O Turismo Ecológico

Poucos exemplos de Turismo Ecológico deram certo no Brasil, diz Samuel. “Um deles é em Bonito (MS), que conheço bem. Bonito é reconhecidamente um Destino Turístico que atrai um grande número de visitantes, que vem em busca da diversidade dos recursos naturais e de seu uso sustentável. A infra-estrutura é perfeita, com investimento relativamente baixo. A partir de uma ótima idéia de aproveitar os campos alagados – pântanos- impróprios para a pecuária (economia até então predominante na região), criou-se um pólo turístico, aproveitando a beleza das piscinas naturais, grutas maravilhosas, cachoeiras, sempre pensando no desenvolvimento sustentável, preservação do meio ambiente. A importância da sustentabilidade vem da fragilidade ambiental dos recursos e, portanto da necessidade de seu uso parcimonioso. Diante disso surgiu em meados da década de 90 a preocupação dos proprietários dos atrativos turísticos com os possíveis impactos ambientais a serem causados pelos visitantes. Como medida de bom senso adotou-se o limite de capacidade de carga, que vem a ser, a grosso modo, o número de visitantes que uma área pode receber sem impactos ambientais significativos. Todo esse trabalho é formado por uma cadeia de elos, entre os parceiros envolvidos, onde é fundamental o respeito ao meio ambiente em primeiro lugar. Afinal os visitantes de Bonito estão à procura de excelência na qualidade dos serviços e uso sustentável dos recursos. Para tanto o trabalho de sensibilização aos atores envolvidos no processo deve ser constante.

O Turismo Histórico-Cultural

“O Turismo Histórico-Cultural no Brasil também precisa ser repensado, reavaliado, e bem cuidado, pois a degradação dos monumentos no Brasil é enorme. Por exemplo, quando pensamos numa Estação do Cipó, aqui em Sacramento, quase choramos. Ou a Estação de Jaguará, próxima à histórica ponte de ferro que atravessa o Rio Grande. Aquilo tudo está caindo aos pedaços, serve de depósito para pescadores. A Usina Cajuru teve uma revitalização interessante a partir do último governo, quando o professor Carlos Alberto Cerchi assumiu a sua recuperação. Hoje, sei que foi entregue à iniciativa privada e já está funcionando. Então, a ponte velha de Jaguará, aquilo é um monumento histórico. Essa questão de asfaltamento das ruas é polêmica, o asfaltamento da estrada da Gruta, a própria descaracterização da Gruta, a gente não sabe como os órgãos ambientais permitiram isso. O turista dá muito valor a esses detalhes singulares.”

Turismo religioso em Sacramento

Na opinião de Samuel, o turismo no município caiu muito depois da morte de Chico Xavier. “Sacramento perdeu muito, porque Uberaba era passagem obrigatória e depois da morte de Chico diminuiu. Hoje, não vemos tantos ônibus, mas quando havia um movimento maior não havia uma estrutura para recebê-los, eles ficavam ociosos depois que faziam as visitas. Não havia um restaurante aberto para abrigá-los, não havia eventos, uma área de lazer, um local para tomar lanche, um atrativo... e não mudou nada. É vir um dia e ir embora. E assim a cidade vai perdendo por falta de planejamento”.

O histórico Desemboque

“O Povoado do Desemboque também poderia ser melhor explorado no ponto de vista do turismo histórico.” Mas vejo que sempre faltou investimento, conscientização da importância do turismo para o desenvolvimento da comunidade. A gente conversa com os moradores de lá, e é visível a vontade, mas falta apoio, planejamento, estrutura para receber e motivar a visita do turista”, explica, exemplificando com as cidade de Salesópolis, onde localiza a nascente do Rio Tietê. “Elaboramos um Plano Diretor de Desenvolvimento Turístico a pedido da Prefeitura municipal. Foi implantado como planejado e já no primeiro ano o crescimento foi de mais de 200%. O turismo gera benefícios ambientais, econômicos, sociais e culturais. Ambientalmente, ele contribui para a conservação da biodiversidade, auxilia na manutenção da qualidade ambiental dos atrativos turísticos e na proteção de espécies ameaçadas. Economicamente, viabiliza as áreas utilizadas pelo turismo, proporciona um diferencial de marketing, gerando vantagens competitivas para os empreendimentos e facilita o acesso a novos mercados, principalmente o internacional. Social e culturalmente, assegura boas condições de trabalho, enfatiza a preservação do patrimônio cultural e promove o respeito aos direitos dos trabalhadores, povos indígenas e comunidades locais, e politicamente promove o respeito à lei e à cidadania.

Hotelaria

A hotelaria é uma indústria de serviços que possui suas próprias características organizacionais. Sua principal finalidade é o fornecimento de hospedagem, segurança, alimentação e demais serviços inerentes à atividade de receber. “Hotelaria é a área que mais emprega no comércio, portanto, fator de atenção para o município que pretende investir em Turismo. A hotelaria nacional tem um faturamento, da ordem de U$ 2 bilhões de dólares ano.

“Às vezes, as pessoas ficam perguntando, o que a gente faz na área. É simples, administrar grandes hotéis. Trabalho em um hotel de luxo, que conta com 800 funcionários, dois para cada quarto. Toda administração do hotel fica a cargo de um profissional da área. A tarefa de administrar não é simples, especialmente quando se trata de um empreendimento tão diversificado quanto um hotel, e, ainda, por se tratar de uma indústria de serviços, cujas diferenças são marcantes em relação à indústria de bens.”

Hoje não há mais aquela definição de três, quatro, cinco estrelas. Os hotéis, estão divididos em categorias Super Luxo, Luxo, Superior, Turístico, Econômico e Simples. Antigamente no Brasil, havia 130 hotéis cinco estrelas, hoje existem 30 hotéis na categoria Super Luxo e Luxo. Isso, porque pra se atingir este nível é difícil. Não é como antes, quando os hotéis recebiam estrelas por fatores estritamente políticos. Muitos daqueles hotéis cinco estrelas, hoje, estão falidos como é o caso do tradicionalíssimo Maksoud Plaza. Esses hotéis não acompanharam a evolução dos tempos, ou seja, pararam, não inovaram para atender as exigências atuais, e assim, cederam lugar para novos e modernos empreendimentos, que mantêm o olho sempre aberto para o futuro.”

O futuro...

Samuel pretende se fixar na Europa, onde o profissional em Hotelaria é extremamente valorizado e para isso, aguarda a aprovação da cidadania italiana, pelo nome PUCCI. “Estou em férias e aguardando propostas de redes européias. Tenho dois vistos de trabalho americanos, além do canadense, mas pretendo trabalhar na Europa, que possui grandes redes de hotelaria, como por exemplo a francesa Accor, maior grupo de hotelaria mundial. O Brasil é um país ainda com pouca tradição no setor hoteleiro. Aqui não há muito campo para minha área. É uma realidade que os profissionais de Turismo e Hotelaria têm que admitir.

Praias, florestas, rios, montanhas, cidades históricas, culinária diferenciada, além do mais importante, a alegria e hospitalidade brasileira. É inegável a vocação natural para o turismo de nosso país. Se um governo busca a criação de empregos, geração de divisas, redução das desigualdades regionais e melhor distribuição de renda, deve apostar no Turismo, aproveitando a riqueza natural, cultural, econômica e histórica do Brasil.