Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Sacramentana faz pesquisa em saúde pública

Edição nº 1370 - 12 Julho 2013

A jovem Gabriela Tavares Magnabosco, 27, filha da professora Shirley Aparecida Ribeiro Tavares Magnabosco  e de Sílvio Alves Magnabosco (de saudosa memória), estudou na Escola Coronel até o primeiro ano do  ensino médio, concluindo-o no Colégio Rousseau. Brilhante nos estudos, realizou o sonho de ingressar no curso de Enfermagem, na USP de Ribeirão Preto, onde se formou e, fazendo jus à aluna exemplar que foi, ingressou direto no doutorado.

“- Fiquei um ano como apoio técnico em pesquisa pelo CNPQ e daí entrei no doutorado direto, porque fiz iniciação científica durante toda a graduação, já possuía publicações, tinha média ponderada alta na faculdade, além de nível alto no inglês. Passei pelo processo seletivo e análise do projeto de pesquisa e já estou no terceiro ano, me dedicando à área de Saúde Pública, porque sempre gostei de aliar a parte social, epidemiológica e sanitária com a questão da saúde em si e, na Saúde Pública temos mais possibilidades de ver a pessoa como um todo”, destaca. 

Gabriela faz parte de um grupo de estudos, GEOTB – Grupo de Estudos Epidemiológicos e Operacionais em Tuberculose, um dos pioneiros no país em estudos sobre Sistema de Saúde, Organização de Serviços de Saúde e Saúde Pública.  Nesses três primeiros anos do doutorado, junto ao grupo de pesquisa, já visitou diversos países e outros o serão até 2014, para a apresentação e discussão dos resultados das pesquisas desenvolvidas.  

“- Este mês de julho, a partir desta seguna-feira, estaremos na China, como palestrantes em um Congresso Internacional e lá vamos apresentar os resultados do trabalho de dois anos e meio no Brasil. E vamos receber opiniões de expertises de diversas partes, Austrália, África e Estados Unidos, por exemplo. Em agosto, sigo para a Espanha por seis meses, para realização de um estágio em pesquisa, onde aprofundarei no referencial de Avaliação de Serviços de Saúde, já que a Espanha, é hoje o grande destaque nessa temática, e tem um sistema de saúde parecido com o do Brasil em alguns aspectos, o que permite uma avaliação comparativa da saúde do Brasil em relação a este país.”

 

“Sistema Único de Saúde é único no mundo”

 

Depois de visitar vários países, o grupo de pesquisadores constatou que o Sistema Único de Saúde (SUS) é único, diferente de tudo o que há noutros países. “O Brasil é o único país do mundo, em que a saúde é financiada pelo Governo de forma universal. Pena que não funciona como deveria. Os outros países têm dificuldade em entender como isso funciona, porque na maioria deles a saúde é feita através de convênios, sem vinculo ao governo, como no Brasil”, informa. 

De acordo com Gabriela, mesmo com essas deficiências, o SUS é um exemplo de gestão pública em muitos países. “E eles têm razão. Porém, a teoria é bem diferente da prática. A verdade é que muitos princípios do SUS existem realmente só no papel. Se o sistema fosse aplicado como o que prega a proposta, seria fantástico. E a nossa pesquisa visa justamente isso: descobrir por que o SUS não funciona a contento e encontrar meios de readequá-lo”, explica. 

De acordo com a doutoranda Gabriela, muitos desvios de conduta atrapalham o real funcionamento do SUS. “O SUS vai demorar a pegar o jeito. Mas esperamos que um dia ele, realmente funcione conforme a proposta”, estima, apontando algumas constatações:

“- Na pesquisa analisamos três aspectos: estrutura, processo e resultado. Na estrutura, avaliamos toda a parte física, como recursos, materiais, insumos e recursos humanos. E é aí que começa a deficiência. E se falha aí, o processo torna-se prejudicado e os resultados não vão aparecer.  Temos detectado que, além das precárias condições das unidades, faltam materiais e insumos. E ainda há sobrecarga de recursos humanos”, aponta. 

Nas constatações feitas na área de recursos humanos, o grupo chegou à conclusão de que os profissionais não têm preparo, engajamento e nem vontade de fazer aquele trabalho.  “O atendimento é feito sem um compromisso maior. E isso ocorre, porque os profissionais no Brasil  não são incentivados para trabalhar em serviço público de saúde”, afirma. 

Para Gabriela, a falha começa no descompasso entre as propostas do governo e o investimento do mesmo, o governo incentiva a descentralização das ações de saúde para a Atenção Básica e o fortalecimento da Estratégia de Saúde da Família, no entanto, o que vemos é uma política de investimento, até mesmo eleitoral, em Unidades de Pronto Atendimento, as quais ficam superlotadas por casos sensíveis à Atenção Básica, ou seja, passam a atender uma demanda que poderia e deveria ser sanada na Atenção Básica, com menores custos e de forma continua. Além disso, a formação profissional também é avessa. 

“- A formação é falha, os médicos, em sua grande maioria, são preparados para consultórios, especialidades, e isso prejudica o processo assistencial na atenção básica. Essa é uma parte tão negligenciada na Medicina, talvez por falta de incentivo e condições de trabalho, que é  difícil encontrar  médicos da saúde da família. E é o que ocorre com os demais profissionais: enfermeiros, técnicos e agentes comunitários de saúde. O que precisa é investir na organização do sistema de saúde, reestruturar a rede de atenção, formar e incentivar recursos humanos para atuar nessa estrutura, fazer da Atenção Básica coordenadora do cuidado, articulada aos demais serviços de saúde, que seja o centro da assistência, de modo a acompanhar os casos com maior proximidade, promovendo saúde, na prevenção e assistência direta.”, constata. 

Cumprindo já o objetivo de fazer o SUS se transformar num sistema realmente exemplar, o grupo de estudos operacionais tem estado em contato com diversos setores da saúde e dado a sua contribuição ao país. “Temos sede em Ribeirão Preto, mas temos projetos multicêntricos em todo o país. Em Ribeirão, temos uma parceria com total apoio da Secretaria de Saúde, e quem ganha é a cidade e a população como um todo. Já tivemos reuniões com vários secretários de saúde nos estados e temos reuniões periódicas em nível de Ministério da Saúde, já com várias propostas que têm sido bem vistas. E há o interesse em implementá-las. Um desses projetos é o de  'protocolos de políticas públicas de  assistência',  que são de muito interesse do Ministério”, informa. 

Explicando o projeto, Gabriela diz que ele vai direcionar as políticas públicas de acordo com a realidade de cada região. “Hoje as políticas públicas são jogadas de cima para baixo, para o país inteiro, e os locais acabam não atingindo as metas, porque, muitas vezes, as pessoas não sabem nem pra que fazer aquilo, nem como implementá-las. Ou seja, aquele tipo de política pública não atende às necessidades daquele lugar. São realidades e necessidades completamente diferentes,  por isso as políticas públicas têm que ser diferenciadas. Ficamos felizes com o interesse do Ministério e esperamos que de fato seja levado a efeito”, destaca.  

 

Temos que investir em Educação

 

Até o fim de junho, o GEOTB permaneceju no Mato Grosso e na Bahia. Nesta segunda-feira segue para a China, para o Congresso Internacional, a partir do dia 15, e, em agosto, segue para a Espanha, representado por Gabriela e outra doutoranda, onde permanecerão por seis meses. Outros países ainda serão visitados para complementar os dados, e partir para a finalização da tese. 

Questionada se estava no roteiro do grupo uma visita a Cuba, para conhecer o seu Sistema Nacional de Saúde, referência mundial sobre saúde pública, Gabi, disse que o grupo não tinha contato com universidades ou pesquisadores de Cuba. Através de emeio, Gabi nos respondeu mais tarde:  “Isso poderia ser muito interessante para nós. Conversei a respeito com o grupo de pesquisa e estamos articulando contatos para viabilizar essa aproximação que permitiria várias trocas. Como o meio da pesquisa é muito vinculado à contatos e articulações, acaba ficando um pouco limitado a existência desses contratos, por isso não está no roteiro do grupo, ainda”. 

Com uma visão muito forte de cidadania, Gabriela é também exemplo de uma jovem altruísta. Na sua mensagem a outros jovens universitários, recomenda, em primeiro lugar, a formação educacional.  “Temos que investir, primeiramente, na educação, nunca desistir, ir atrás, se dedicar aos estudos, se formar e formar bem naquilo que gosta, para depois  devolver isso de alguma forma para a sociedade. Penso que, nós que estudamos em escolas públicas, de uma forma ou outra, temos a obrigação de devolver isso à sociedade , não deixar que isso se perca”, afirma.  

Gabriela sente também que toda formação quando é bem feita muitas oportunidades aparecem. “O mundo nos dá muitas oportunidades, muitas portas são abertas quando nos formamos bem. Todas as nossas viagens são financiadas pela Fundação de Amparo do Estado de São Paulo (Fapesp), pelo CNPQ e  CAPES, tudo isso, pelo meu esforço desde o início dos estudos. Meu sonho sempre foi ingressar na USP e tive isso como meta e muitas oportunidades têm surgido”, reconhece, agradecida.