Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Retratos de família

Edição nº 1407 - 28 Março 2014

Numa época em que instituição família, nos moldes como a conhecemos, passa por significativas transformações, pareceu-me oportuno levantar algumas questões sobre o tema.

Primeiramente, perguntar qual o retrato de família que habita o nosso ideário e, como estamos nos posicionando frente a tantas mudanças: Impactados? Serenos? Assustados? Pensando sobre o conceito de família que, aos poucos, vai se configurando de forma tão diferente da tradicional, reportei-me ao Livro dos Provérbios 31, 10-31, que enaltece a mulher virtuosa. Embora descritos de forma poética, esses versos não expressam mais a realidade de hoje. Complexos fatores estão interferindo no interior dos relacionamentos humanos. Surgem debates, opiniões divergentes e organizações defendendo outras formas de estruturação familiar.

Destaca-se, neste contexto, um movimento bem fundamentado que defende, entre outras coisas, o direito de se obter mudanças significativas no modelo da família tradicional. Entendem a família nuclear como um retrocesso a bloquear a livre expansão do amor. Argumentam que a instituição família, tal como a conhecemos, se constituiu sob a chibata das igrejas, da dominação machista, do poder econômico e das conveniências políticas. Esse movimento tem marcado presença em importantes acontecimentos nacionais e internacionais inclusive na conferência promovida pela ONU (Pequim 1995). 

Entre outros argumentos, levantam a questão do gênero que sustenta o direito dos filhos de terem liberdade total na escolha da orientação sexual que desejam e, desta forma, se libertarem do sexo biológico com o qual nascemos. Conhecido como Movimento Feminista, tal organização defende a tese de que as diferenças entre homens e mulheres são meras construções sociais.    Entendem não haver, na dimensão humana, apenas o masculino e o feminino, derivando, desse entendimento, concepções de matrimônio condizentes com tal argumento. Assim, as diferentes orientações sexuais não constituiriam obstáculos para que as uniões homo afetivas pudessem assumir modalidades diversas de casamento. Contrapondo-se a tal posicionamento, o Movimento Pro-Família tem, igualmente, levantando sua bandeira em defesa da família nuclear obtendo, neste contexto, expressivas adesões.

Não há como ignorar que a família, nos moldes patriarcal e monogâmico, está em crise. Não há também como negar as evidentes transformações que vêm ocorrendo na composição familiar de nossos dias. Já assistimos a cenas em que casais com filhos oriundos de outros casamentos, formaram famílias cujos filhos dessas novas uniões, nem sempre se conheciam.          

Sem dúvida, a família está em desordem, mas há os esperançosos que desejam colocar em ordem o que saiu da ordem.  Tarefa difícil, se considerarmos que, algumas falhas no modelo tradicional, acabaram por gerar, no seu interior, conflitos e desajustamentos até nos próprios filhos, mas que, apesar disso, conseguiram manter vínculos parentais de amor, respeito, sentimento de continuidade e pertinência... principalmente, continuidade: avô, pai, filho, netos, bisnetos oriundos de um mesmo núcleo. Apesar dos erros, a família tradicional assegura fortes vínculos afetivos.

Ninguém sabe o rumo que as coisas tomarão.  Uma verdade, no entanto, precisa ser considerada: o cuidado para que nenhum desamparo venha atingir as crianças. Sejam quais forem os novos paradigmas a direcionar as famílias, esse pecado não podemos tolerar.

(*) Mariù Cerchi Borges é educadora