Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

O Papa

Edição nº 1350 - 22 Fevereiro 2013

Já vinha observando, há algum tempo, alguns sinais no semblante de Bento XVI, que deixavam transparecer sua fragilidade: no andar, no olhar, na postura, no abatimento, no timbre da voz.  Parecia-me alguém prestes a sucumbir e eu temia por isso. Pensava: cansado ou não, disposto ou não, adoentado ou não, teria que cumprir com os compromissos agendados.  Ficava com pena, imaginando o enorme esforço desprendido por ele para cumprir com o que precisava ser cumprido. Mas, a renúncia, que acabara de acontecer, embora real e já conhecida pelo mundo todo, parecia Inimaginável! 

Acreditando ou não, tal decisão já era fato consumado. Debrucei-me então sobre o noticiário: queria ouvir, ler, acompanhar, o que o mundo estava dizendo desse gesto inesperado, ou, melhor dizendo- não tão inesperado; alguma coisa já pairava no ar. Preparei-me. Sabia que haveria no mundo todo uma enorme repercussão desse gesto que seria tanto de apoio por parte de alguns, como de censura por parte de outros; de incompreensão de muitos e de decepção para tantas outras pessoas e de respeito pela maioria dos fieis.

Tendo lido alguns de seus livros, algumas de suas encíclicas, entrevistas concedidas a jornalistas, conhecia, em parte, o que pulsava, fortemente no interior, deste homem vestido de branco. Por trás do conceituado intelectual e teólogo, eu perscrutava um homem tímido, humilde, sincero e simples cuja fé, centralizada em Jesus, servia como vértice  a direcionar sua vida. 

Não concordo com os que insistem em acusá-lo de conservador. Aliás, não entendo, bem o que significa ser conservador.  Deixar de  ser conservador seria tocar o barco conforme os ventos da modernidade? Se o mundo está de ponta cabeça  a Igreja deve acompanhá-lo varrendo os valores que defende para se apresentar ,”bonitinha no baile” e agradar os que se negam a refletir sobre os descalabros em que nos encontramos, é deixar de ser conservador?  

Se assim for, sou forçada admitir não saber de que arejamento a Igreja está precisando. Não estará o mundo carecendo de valores e virtudes? Que tal o desafio do exercício das virtudes tão esquecidas? Carismático ou não, conservador ou não, o que precisa verdadeiramente ser avaliado é o que esse homem, da Cátedra de Pedro, estava reapresentando ao mundo. Missão nada fácil numa época de tal forma secularizada onde impera como força propulsora, o relativismo (já denunciado por ele), cujo patrulhamento consiste em desfazer qualquer verdade que se “atreva” a se colocar como tal. 

A lei que prevalece, no ideário coletivo, se resume numa simples equação: se é desejável fazer, é certo. É o desejo que dita as regras; o querer de cada um é absoluto e, ponto final. Então, para que ficar debruçado numa busca incessante da verdade quando a verdade de cada um é o que prevalece?  Complicado, não é?

Sentiremos sua falta, Bento XVI, mas, conforme corre por aí, o senhor vai se dedicar a uma vida de clausura voltada para estudos, pesquisas, escrita e orações. A crença no poder da oração norteou sempre a sua vida. São suas as seguintes palavras: “A oração é a respiração da alma e da vida. Sem a oração cotidiana, vivida com fidelidade, o nosso fazer se esvazia e se reduz a um simples ativismo que nos deixa por fim insatisfeitos”.  Certamente, com suas orações,  o  sentiremos bem mais próximo de nós.  Boa sorte Bento XVI.

 

Mariú Cerchi é educadora