Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Primeira ocupação dos Sem-terra aconteceu em 1998

Edição nº 1599 - 01 de Dezembro de 2017

Em 4 de junho próximo completam-se 20 anos da ocupação da fazenda Olhos d'Água, a primeira fazenda do chapadão do Bugre, no município de Sacramento, a ser ocupada pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). 

Na edição do dia 14 de 1998, o ET registrou: “O Movimento dos Trabalhadores Sem Terra do Brasil - MST – ocupou, na madrugada do dia 4 de junho, a fazenda Olhos d'Água, neste município. Cerca de 30 pessoas montaram oito barracas a espera de outras famílias que chegariam em dois ônibus e três caminhões, mas que se perderam na região. Segundo um dos líderes o movimento, a área possui 2 mil hectares (ha) e o MST espera assentar no local 70 famílias, muitas delas de Sacramento”.

Passados quase 20 anos, a fazenda Olhos d'Água se transformou no Assentamento Olhos d'Água, com 27 famílias ocupando lotes de 38 ha cada um, totalizando 1.018 ha. O restante é reserva legal. Ainda sem os títulos definitivos, das 27 primeiras famílias assentadas, a maioria delas desistiu dos lotes.

A informação é de Janete Santana, presidenta do Sintraf (Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura Familiar) e do Partido dos Trabalhadores local, uma das assentadas. “Das primeiras famílias assentadas, no início do processo, várias passaram os lotes pra frente, por dificuldades diversas, uma delas a falta de adaptação à terra”, informa, esclarecendo que, na verdade, as famílias 'desistiram' do lote, porque ele não pode ser comercializado, porém são indenizadas pelas benfeitorias.

“- De acordo com as normas do Incra, os novos assentados são obrigados a indenizar os antigos por aquilo que tiveram de despesas no local, como por exemplo, as benfeitorias, cerca, imóveis, animais.   Todas as 27 famílias que moram no local estão produzindo, a maioria trabalha com gado de leite, além de pequenas produções para consumo próprio, Isto é, para a sua subsistência, de forma que a comercialização é mesmo do leite”, informa mais Janete. 

Nesses 19 anos, muitas das famílias assentadas tiveram ali os seus filhos e muitos deles permanecem com os pais trabalhando na terra. “Eles se adaptaram ali, são 27 casas, cada um no seu canto, numa comunidade estruturada, com uma associação comunitária com diretoria e tudo o mais”, informa.

 

Olhos d’Água em organização administrativa

O produtor assentado, Erlânio de Oliveira, das Sete Voltas, preside a associação dos moradores e representa a comunidade legalmente. “Nós nos reunimos mensalmente como um assentamento bem estruturado, somos uma comunidade muito bem organizada que vive com o que produzimos no local. Como produtores familiares temos aporte do  Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) que  financia projetos individuais ou coletivos, que gerem renda”, diz mais Janete, informando que todos aguardam a escritura do lote. 

 “- Nós ainda estamos ligados ao Incra, porque temos ainda o contrato de concessão de uso, isto é, não temos escritura da terra, ainda somos assentados da Reforma Agrária. O assentamento está passando agora por uma transição. Recentemente, tivemos a visita de fiscais do Incra para avaliar a questão de fossas sépticas, permanência das famílias nos lotes e a próxima etapa será a assembleia para titular o assentamento Olhos d´Água. Dependendo dos resultados da avaliação e da forma como for encaminhado, as 27 famílias recebem o título definitivo da terra. Estamos no processo final da titulação”, informa, revelando sua alegria como assentada. “São 27 famílias vivendo da terra. Eu como parte integrante do assentamento Olhos D´Água, me sinto orgulhosa”. 

 Ao contrário do que se diz ou pensa, mesmo estando com o título definitivo, o proprietário não tem autorização para vender a área. Ele tem que pagar antes pela terra ao governo. “Teremos um prazo de carência e só depois iniciamos o pagamento do lote em até 20 anos. Essas exigências do Incra, visam à manutenção da terra na família, a agricultura familiar, do contrário a área volta ao latifúndio. E para isso existem procedimentos a serem adotados, um deles é a herança. E nós no assentamento Olhos d´Água, vamos adotar o sistema de herança”, adianta Janete.  

Finalizando, informa que os assentados da fazenda Olhos d'Água recebem da prefeitura todo o apoio que é dado às demais comunidades rurais, como transporte escolar, atendimento médico e manutenção nas estradas. 

 

Acampamento Jaime Cardoso

Centenas de famílias que ocuparam a fazenda de 4 mil ha, de propriedade da Agroflorestal Serra da Canastra, mais conhecida como Fazenda Binotto, nas proximidades do povoado das Sete Voltas, no dia 5 de novembro, continuam no local, aguardando decisão da justiça. 
Segundo o Prof. Ivan Sebastião Barbosa Afonso, procurador aposentado do Incra, esclareceu em entrevista ao ET, que o momento agora é “de prudência, paciência e espírito de conciliação”. Segundo o professor, em Minas Gerais, a Vara Especializada em Conflitos Agrários, tem agora a competência para a solução do problema, após ser acionada pelos proprietários, através da competente Ação de Reintegração de Posse, cujo passo inicial é ouvir os órgãos envolvidos, em especial, o Incra, que possui em Belo Horizonte um Ouvidor Agrário.
De acordo com Janete Santana, o acampamento está crescendo todos os dias. “Só hoje (22/11), já passaram por aqui 20 famílias, para organizar a documentação do cadastro que é feito pelos coordenadores  do MST, Daniel e Tainá,  que estão no acampamento Jaime Cardoso”, explica e prossegue, informando que o acampamento está na fase de implantação da estrutura básica.
“- Já foi feita  a instalação do reservatório de água que irá para os barracos. De quatro em quatro barracos haverá uma torneira para abastecer as famílias. Estão trabalhando também com os postes para levar energia ao local, nas ruas do acampamento formado e uma lâmpada em cada barraca. Já organizaram também a farmácia básica e a cozinha coletiva”. 
Sobre as crianças, Janete informa que todas já estão sendo levadas para as escolas de Jaguarinha e Quenta Sol, através do transporte do município. “Os que foram de Sacramento   para o acampamento e cujas crianças estavam estudando, as mães foram orientadas a voltar para a cidade para que as crianças terminem o ano letivo na escola de origem para que, no próximo ano, elas sejam encaminhadas às escolas rurais”. 
Janete não soube precisar quantas barracas estão no local, mas informa que o acampamento tem mais de 500 famílias numa área de 13 mil ha. “De acordo com as informações que temos e de documentos levantados, a área possui 13 mil ha, permanecendo 500 famílias, a área para cada uma, caso seja efetivado o assentamento, será de 3,4 alqueires”.  
Ainda segundo Janete, o acampamento já possui uma estrutura administrativa. “Cada grupo é formado por 20 famílias, que formam um núcleo que já trabalha em vários setores: de infraestrutura, educação, segurança e saneamento. Cada núcleo tem um casal de líderes e, para nossa felicidade, um dos núcleos colocou o nome de Professor Didi, que era um dos assentados junto comigo, na fazenda Olhos d´Água. Os grupos estão se organizando para iniciar o plantio coletivo de milho e feijão”. 
O que é área improdutiva para o MST?
Os Sem-terra ocuparam uma área que alegam ser improdutiva, quando na verdade, a propriedade está arrendada para empresas que cultivam uma grande produção agrícola, anualmente. No momento da ocupação estavam ainda em fase de plantio de várias culturas, como soja, milho, batata, cebola, além de uma grande área reflorestada.
Ao ser questionada pelo ET sobre o que é uma área improdutiva na visão do MST, Janete explica: “Na verdade,  a exploração da terra deve ser feita pelo proprietário e no caso lá, a terra estava arrendada para terceiros. A terra não tem documentos. Não encontramos documentos das terras, tanto que recentemente, por informações de corretores de Sacramento, a terra foi para leilão e não foi arrematada, porque não tem documentos. Então, eles estão trabalhando na área nessa situação. Os que se dizem donos, que nós chamamos de 'posseiros' porque não têm documentação legal da terra, eles arrendam para terceiros, então. Conclusão,  se a área não é explorada pelo proprietário, ele está acumulando terras”, explica.
Sobre a área plantada na fazenda pelos arrendatários, Janete respondeu que os Sem-terra ali acampados estão respeitando todas elas. “Existe um acordo entre o MST e os arrendatários de paz e tranquilidade. O que é dos arrendatários é deles. E há uma grande área reflorestada, mas isso ainda não foi discutido”. 
A relação PT-MST
Qual a relação do PT com o MST, foi a pergunta feita a Janete, presidenta do partido na cidade: “O PT sempre foi apoiador dos movimento sociais. Nós emprestamos o nosso apoio com o nosso espaço da sede e, individualmente, cada petista que tenha condições contribui como pode. Enquanto partido, oferecemos a nossa estrutura”. 
Finalizando, Janete justifica o nome do acampamento que tem como patrono, 'Jaime Cardoso. “Trata-se de uma homenagem a um sem-terra do Assentamento Florestan Fernandes, de Uberlândia. Jaime acolhia a todos no lote dele e o que podia fazer pelas famílias ele fazia”.  De acordo com Janete, tanto Jaime quanto a esposa morreram este ano. 
Juiz determina desocupação da área
Em despacho publicado no dia 29 de novembro, o juiz da Vara Agrária de MG, Pedro Cândido Fiúza Neto, determinou desocupação da área da fazenda Chapadão do Zagaia, de propriedade da Agroflorestal Serra da Canastra, ocupada pelo MST, dia 5 de novembro. O juiz tomou como base a determinação da desembargadora relatora que dá cumprimento à liminar de reintegração da posse, interposta pelos proprietários da fazenda.
Determina o juiz, para o cumprimento do mandado, que:
- “o prefeito do município seja comunicado da decisão para que a rede de assistência social se antecipe e atue como de lei, na identificação e amparo dos necessitados”.
- “faculta-se ao Oficial de Justiça valer-se, caso estritamente necessário, de apoio policial para o cumprimento da desocupação forçada...”
- “no cumprimento do mandado, deverão ser, rigorosamente, observados os direitos fundamentais constitucionais dos requeridos...”