Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Privilégios e Corrupção

Ricardo Alexandre de Moura Costa(*)

As eleições estão aí e com ela a difícil tarefa de escolher o "menos pior" dos candidatos frutos de uma instituição política que se caracteriza muito mais pelos privilégios do que pelas responsabilidades.

Privilégios, nas palavras de Guilherme de Souza Nucci, "são herança de uma legislação elitista que muito se compatibilizou com os regimes ditatoriais fundados na imposição da força e na suposta superioridade das autoridades". Antigamente aqueles que possuíam títulos de nobreza somente seriam presos por mandados especiais do rei, mostrando-se que era dado, e ainda é, maior valor à noção de autoridade do que à noção de igualdade, com o pequeno agravante de que hoje a igualdade é um dos pilares da democracia.

Dentre os diversos privilégios que se encontram no nosso ordenamento, está o da prisão especial, onde se criou uma categoria especial de brasileiros que se forem presos dispõem de um tratamento peculiar.

Foro privilegiado, voto secreto dos parlamentares, trancamento de ação penal contra deputado ou senador pela vontade da casa legislativa a que pertence, tudo isso contribui para um sistema político sustentado pela corrupção.

Os defensores do foro privilegiado justificam que ele deve existir como meio de dar especial tratamento ao cargo ocupado pelo agente cometedor do delito, e nunca pensando em estabelecer desigualdade entre os cidadãos. Mas o que ocorre é uma nítida desigualdade, quem comete o crime é a pessoa e não o seu cargo. Será que um morto por um lixeiro é mais morto do que aquele que o fora por um governador?

O voto secreto de parlamentares é outra excrescência e deve ser banido o mais rápido possível do sistema político. A democracia não se coaduna com a escuridão, pelo contrário, ela exige o mais alto nível de transparência dos atos dos representantes do povo. O voto secreto só é válido, em um regime democrático, para os eleitores e não para os eleitos. Para aqueles, ele se justifica na medida em que preserva a livre escolha da pessoa respeitando o seu sigilo e não dando trelas a perseguições. Já os eleitos, devem ser fiscalizados e têm o dever ético de prestar contas à sociedade.

O trancamento de ação penal contra parlamentar pela vontade da casa legislativa a que pertence, é outro nefasto utensílio que favorece o corporativismo e confirma a vergonhosa obscuridade da sistemática normativa brasileira, cuja frase "uma mão lava a outra" é o lema que melhor lhe cai bem.

Em que pese o governo FHC ter enfrentado várias crises mundiais, onde a situação econômica global era muito mais instável do que agora, o governo pecou na transparência, principalmente pela não instalação da CPI da reeleição e em dilapidar grande parte do patrimônio nacional. Ainda me recordo da palestra do brilhante jurista e professor Evandro Lins e Silva quando nos deixou boquiabertos ao salientar que o dinheiro obtido com a venda da Vale do Rio Doce daria para pagar pouco mais de 20 dias de juros da divida externa.

O governo atual apesar de ter conseguido alguns avanços na política econômica, política esta iniciada no governo passado e que recebera criticas de lula e que agora segue a mesma cartilha, curva-se diante do setor especulativo de forma vergonhosa. Levantamento do próprio Banco Central mostrou que em 2005 o setor bancário lucrou 28,3 bilhões, valor 36% maior do que o obtido em 2004 e que já era recorde histórico. Um banco brasileiro teve mais lucro com especulação do que a Volkswagem no mundo inteiro. O setor produtivo brasileiro agoniza-se com uma taxa selic de 15,75% ao ano, no México a taxa é de 7,21%, na Índia 5,47% e no Chile 4,8%, e o resultado disso foi o pífio crescimento anorexo do nosso PIB, 2,3%, o segundo pior da América, melhor somente que o do Haiti um país massacrado pela guerra civil.

Um chega ao poder e diz "esqueçam o que eu escrevi" , o outro chega e diz "o que eu disse eram bravatas".

Se remessas e remessas de dinheiro não fossem desviadas dos cofres públicos, se rios e rios de dinheiro não fossem enviados para o exterior em forma de juros, talvez teríamos dinheiro para a construção das imprescindíveis 110 penitenciárias federais com assistência educacional e profissionalizante. É claro que o crime só se combate com eficácia se investirmos em prevenção (trabalho, escola, moradia), o que o torna um problema também social, mas há medidas que devem ser tomadas para a produção de resultado mais rápido, como a construção de tais presídios. Não é possível manter 45 detentos em uma cela feita para 7.

Enquanto o nosso sistema favorecer os abutres covardes da política que se deliciam com o dinheiro do povo nesse sistema endêmico de corrupção, enquanto tivermos um presidente que elogia e sobe em palanque com José Dirceu, um homem cujo Procurador Geral da República denunciou e o denominou como chefe de uma quadrilha que rapinava o dinheiro público, enquanto tivermos políticos demagogos que se qualificam apenas em campanhas publicitárias milionárias, enquanto tivermos um congresso marcado pelo fisiologismo e incompetência, estaremos fadados a perfilar na liderança entre os paises mais corruptos do mundo.

(*) Ricardo Alexandre de Moura Costa
é advogado