Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

PMS quer mudar Plano Diretor

Edição nº 1423 - 18 Julho 2014

Um convite postado no sítio da Prefeitura na véspera do evento, onde o prefeito Bruno Scalon Cordeiro convidava para a Audiência Pública sobre o Plano Diretor Participativo do Município, dia 10/7, às 17h no auditório do Centro Administrativo, foi a única motivação encontrada pela população para participar de tão importante reunião, que tinha como objetivo alterar, especialmente, os artigos referentes ao parcelamento do solo do Plano Diretor da cidade, Lei 1020 de 30 de novembro de 2006, no seu aspecto ambiental.

A informação acima foi tirada do pequeno público que participou da Audiência Pública naquela tarde. “Audiência Pública, como bem diz o nome, supõe-se uma reunião com ampla divulgação por todos os meios de comunicação, para que haja realmente uma grande participação popular, no entanto, o convite foi postado na rede social, na véspera de sua realização, causando estranheza em todos nós, e que, diante da importância do assunto, começamos a nos comunicar in box reiterando o convite”, disse Carlos Roberto Borges - o Beto da Marcenaria, empresário e defensor do meio ambiente.

O representante do Ministério Público (MP) e curador do meio ambiente, promotor José do Egito de Castro Souza, em entrevista ao ET, disse que só tomou conhecimento formal da reunião às 15h, na data da realização da audiência. Para o promotor a audiência não tinha valor. Primeiro, porque o convite no site da Prefeitura, postado na véspera, não trazia o horário; segundo, caberia a Câmara Municipal realizar a audiência pública. O Projeto de Lei já estava na casa desde o dia 25 de junho, cabendo a ela realizar a audiência pública, com ampla divulgação. 

Na reunião, Egito iniciou sua argumentação lamentando a falta de lógica de promover uma Audiência Pública de tamanha importância sem o devido aviso prévio à população sacramentana como um todo, para que de fato a reunião tivesse a participação maciça da sociedade. 

O secretário de Planejamento, Marcelino Marra, e o Prof. Roberto de Lourdes, representando o prefeito Bruno Cordeiro, dirigiram os trabalhos. Justificando que o preço dos terrenos na cidade estavam exorbitantes, Marra, apresentou a proposta do prefeito Bruno, de se reduzir a área da mata ciliar de todos os loteamentos da cidade que margeiam os ribeirões, Borá, Boa Vista (Japonesa), dos Pintos, Jacá, Benjamim, considerada Área de Preservação Permanente (APP), de 30 para 15 metros.

A proposta do Executivo, em forma de projeto de lei enviado à Câmara, contraria frontalmente, segundo o promotor, lei federal e o próprio Plano Diretor do Município. O projeto que já estava em tramitação na Câmara, até a intervenção do promotor, propõe o seguinte: reduzir uma APP (mata ciliar das margens dos córregos) que deveria ser intocável, de 30 para 15 metros, classificando os outros 15 metros como 'área verde', passível de edificações. E mais, esses 15 m de área verde incidiriam nos 12% obrigatórios, que as imobiliárias são obrigadas a ceder ao poder público, além de 8% do total da área, também cedido como reserva institucional, para construção de bens públicos.

 

“O que isto quer dizer? -planejar um loteamento, as imobiliárias são obrigadas, por lei, a respeitar esses 30 metros de APPs (como matas ciliares, encostas de morros, nascentes, etc); são obrigadas ainda, pelo Plano Diretor, a doar à Prefeitura, além das vias públicas e passeios, mais 12% destinados a área verde (espaços sem construção, para absorção de água, no caso, sem nenhum tipo de construção) e mais 8% de área institucional (reservada para construção de próprios municipais). Portanto, ao  considerar apenas 15 m de APP, ao invés de 30, como determina a lei, a mudança estaria beneficiando unicamente a imobiliária, que praticamente deixaria de doar os 12% reservados para área verde, uma vez que aqueles 15 m de APP seriam transformados em área verde e descontados dos 12% que a empresa loteadora é obrigada a doar ao município”.

Prefeitura aprova projetos sem a lei

Ouvido pelo ET, José do Egito, disse que o Plano Diretor é uma lei municipal que regula o desenvolvimento da cidade. “Nosso plano foi aprovado em 2006, com vários artigos que deveriam ser regulamentado até 2008, o que não foi feito até hoje. Porém, os demais artigos têm eficácia plena, isto é, estão em conformidade com leis federais e estaduais, como o artigo 60, que trata do parcelamento do solo, isto é, estabelece normas para a construção de loteamentos na cidade”, explica. 
“O artigo estabelece a ocupação de apenas 80% da área loteada, porque 12% no mínimo devem ser reservados para espaços livres de uso público, as chamadas áreas verdes, livres de edificações; e 8%, no mínimo, para uso institucional (praça, escola, barracões comunitários). O artigo fala ainda das faixas de proteção ao longo de cursos d´água, que não  podem ser computadas como espaços livres de uso público e que deve ter largura mínima nas margens:  no caso de córregos, lagos e lagoas, 30 metros e, no caso de nascentes, o mínimo de 50 metros”, explica mais, lendo os artigos no Plano que tem em mãos.
De acordo ainda com o promotor José do Egito, o que lhe causou mais estranheza é que o projeto foi encaminhado à Câmara para alterar apenas o que trata do parcelamento do solo urbano, que já está  regulamentado, e não há como mexer nele. “E mais estranho ainda é que todos os outros dispositivos que precisam de regulamentação não estão no projeto. Fica claro,  que a intenção é alterar justamente aquilo que não pode ser alterado, pretende-se mudar justamente uma sessão da lei que está em vigor e é de eficácia plena”, frisou.
Segundo Egito, o projeto “é engraçado”, e explica: “Lendo normalmente, ele está todo certinho, obedecendo os espaços previstos na legislação, mas lá no finalzinho, criaram um parágrafo  que estabelece 15 metros para área de preservação permanente (APP) e outros 15 metros para área verde, passíveis de edificações. Isto é, o projeto derruba tudo, porque a metade dessa área de 30 metros, que é uma área intocável, se torna área edificante”.
“E o pior de tudo, a Prefeitura está aprovando projetos imobiliários, como se este projeto já tivesse sido aprovado pela Câmara e sancionado pelo prefeito”. A denúncia foi feita na entrevista pelo promotor José do Egito. “O que é mais estranho ainda é que o projeto foi para a Câmara no mês de junho, não entrou na pauta a pedido nosso e a Prefeitura já aprovou vários loteamentos na beira de córregos com base nesse projeto de lei, já  antevendo a  aprovação das alterações propostas.  Eu cobrei isso na audiência. Como é que uma lei ainda não está em vigor e a Prefeitura já está aprovando loteamentos com base nela? – perguntou, informando que já  embargou o registro de dois loteamentos até que estejam dentro da lei.  explicou o promotor - Ao 
PL é retirado de pauta
De acordo com o promotor José do Egito, assim que ele tomou conhecimento do projeto na Câmara, solicitou a sua retirada, no que foi acatado pelo presidente.  “O Projeto foi para a Câmara sem a previsão de  audiência pública  o que é uma exigência. Assim que tomei conhecimento, solicitei  a retirada  do projeto, o que foi acatado pelo presidente da Câmara. Fiz o pedido ao presidente, anexei cópia do Tribunal de  Justiça que julgou inconstitucional alterações no Plano Diretor de uma cidade da região, recentemente. A alteração no plano diretor é prejudicial à população e quero uma reunião com os vereadores para discutir este projeto antes da votação”, afirmou.
 Prosseguindo, o promotor lembrou da inconstitucionalidade da proposta apresentada, alertando, inclusive, alguns dos vereadores presentes a promover uma reunião prévia para discutir o assunto, evitando que essa lei no futuro seja derrubada por algum Procurador da Justiça, oferecendo-se, inclusive, a participar da reunião com os vereadores para essa orientação. 
José do Egito explicou ainda a importância da mata ciliar. “O relevo de Sacramento é, por natureza, esculpido de uma forma que, se não houver penetração de água no solo, as enchentes que estamos cansados de ver pela TV, vão se transformar, num futuro bem próximo, em um grave problema que enfrentaremos aqui”, alertou. 
Beto denuncia erros
Beto da Marcenaria (foto), falando ao ET, disse que não acreditou que o prefeito Bruno Cordeiro pudesse apresentar uma proposta daquela. “Ficamos pasmos! O Marcelino disse que daria três minutos para cada um dos presentes opinar. O promotor José do Egito, presente à reunião, respondeu que falaria o que fosse necessário. E foi veemente nas suas observações”, afirmou Beto.
O empresário apresentou na reunião, o que ele chama de “absurdos”, que estão ocorrendo em alguns dos loteamentos da cidade, com a conivência da Prefeitura. “O Plano Diretor é desrespeitado com frequência na cidade. Provas que tenho em mãos mostram que a Prefeitura aprovou a mudança de, no mínimo, de 10 metros, o que determina a lei, para nove metros, a frente de vários lotes de uma quadra de um loteamento na cidade. Em uma casa, no Loteamento Skaff, ela autorizou uma construção que tem menos de quatro metros de frente”, denunciou, destacando que lei determina o mínimo de dez metros de frente por 24 de fundo.
Em entrevista ao ET, Beto disse que a Prefeitura precisava ter um auditor, um fiscal com a maior responsabilidade possível, ou até mesmo a própria Secretaria de Obras deveria assumir essa incumbência, de vistoriar in loco essas áreas loteadas.
“- Recentemente, eu mesmo tomei essa tarefa de fiscal e verifiquei que a Prefeitura aprovou dois loteamentos com prejuízo ao município de quase um hectare de área, conforme publicação em jornal local. O MP acatou minha denúncia, e foi apurado o favorecimento aos loteadores em desfavor do município de Sacramento”, revelou.
Também manifestaram sua apreensão sobre tudo o que vem acontecendo em relação a alguns loteamentos na cidade, a falta de proteção ambiental e a falta de fiscalização, o ex-vereador, Prof. Carlos Alberto Cerchi, que lembrou de movimentos em defesa do meio ambiente, como as ongs, Rio Grande e Movimento Veredas. A ambientalista Wanina Wetzel e o vereador Pedro Teodoro R. Resende defendeu o Plano Diretor votado em 2006, no sentido de e preservar os 30 m como APPs nas margens dos córregos.
Finalizando, arrancando aplauso, o secretário do Meio Ambiente, Maurício Scalon, contrariando a posição do governo Bruno em relação ao assunto, confirmava o pensamento dos presentes, que, aquela Audiência parecia ter sido destinada apenas àqueles que não se opunham ao projeto de mudança proposto pela Prefeitura. 
Sem acordo, uma outra Audiência Pública, com ampla divulgação, será agendada pela Prefeitura.