Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Entrevista – Joaquim Eustáquio de Oliveira - O moleque do Borá que virou escritor

Edição nº 1572 - 26 de Maio de 2017

Joaquim Eustáquio de Oliveira é um dos “moleques do Borá”, expressão cunhada dos bandos de moleques que faziam do ribeirão que corta a cidade o seu passatempo preferido, nadando pelados nos belos poços então existentes em toda sua extensão acima das redes de esgoto. Nasceu no Caxambu, zona rural próxima ao Desemboque. Já naquele início dos anos 60, acompanhou o êxodo rural, órfão de pai, que perdeu ainda criança, veio com a mãe e os sete irmãos para a cidade... Cresceu, estudou, trabalhou... Casou-se em 1990 com Luseni, em Monte Carmelo (MG), com quem teve as duas filhas: Jeanny, formada em Engenharia Civil (Uniube) e Laysla, que se forma este ano em Relações Internacionais (Faculdade Esamc de Uberlândia). Atualmente reside em Araxá (MG). Veja nesta entrevista um pouco de sua vida:

 

ET - Então, Joaquim, você mesmo se diz que era um dos 'meninos do Borá'. Conta um pouco de sua infância.

Joaquim Eustáquio - Nasci no Caxambu no dia 09 de março de 1960. Sou filho de Antônio Marques de Oliveira e Doralice Maria dos Reis, irmão de Maria das Dores, Hélio Baltazar, Valdir Gaspar, Antônio Marques Filho, Edno Marques, Helenice Maria e Eudes Gabriel. Minha vida escolar na cidade começa na EE Afonso Pena Júnior (Grupão), fazendo lá parte do 1º ano e o restante do antigo primário, no Colégio Allan Kardec. O início do ginásio foi cursado na EE Cel José Afonso de Almeida, até o início da sétima série. Anos depois, concluiu o ensino fundamental e o ensino médio através do supletivo, por exames de massa. Sou graduado em Letras pela Faculdade de Ciências Humanas e Sociais de Monte Carmelo (FUCAMP - Fundação Carmelitana Mário Palmério).

 

ET - Concomitante aos estudos, a lida diária desde os tempos da roça, sabemos que foi árdua. Quando começou a trabalhar?

Joaquim Eustáquio - Muito cedo, desde os 7 anos de idade em fazendas da região. E depois nas reflorestadoras da região de Sacramento. Ainda adolescente mudei-me para São Paulo onde trabalhei na área de construção civil. Depois, como motorista na construção do aeroporto de Confins, na região de Belo Horizonte. Também trabalhei na ferrovia dos Carajás, no Pará. A partir do final de 1981 a 1986, estive trabalhando no Iraque, como feitor de transporte pesado e operador de máquinas pesadas em duas grandes obras: Rail way (ferrovia) e Express way (rodovia), em quatro contratos de nove meses cada. 

 

ET - Nesses cinco anos no oriente médio teve oportunidade de conhecer a região?

Joaquim Eustáquio - Sim, especialmente lugares históricos e bíblicos, como as ruínas da Babilônia e a milenar Baghdad. Entre as idas e vindas nessas viagens, passei também por vários países, como Itália, Portugal, Alemanha, Áustria e Estados Unidos. 

 

ET - Retornando ao Brasil, com 26 anos, onde mais trabalhou até sua aposentadoria?

Joaquim Eustáquio - Trabalhei em transportadoras de minério de ferro, na região de Belo Horizonte. Como motorista de táxi trabalhei em Ribeirão Preto (SP). Por um ano trabalhei no Estado de Minas Gerais como motorista da Delegacia de Ensino de Monte Carmelo (MG). E nos últimos vinte e dois anos, até me aposentar, trabalhei na Prefeitura de Monte Carmelo (MG).

 

ET - E essa veia literária, nasceu quando?

Joaquim Eustáquio - Interessei-me pela leitura desde os primeiros anos escolares, onde aprendi a viajar usando a imaginação, através dos universos que conhecia pelos livros. Sempre fiz questão de transmitir e incentivar esse gosto pelo meio literário para as minhas filhas. Desde pequeno, gostava de escrever poesias, textos reflexivos e histórias. Aliás, o Prof. Walmor é um dos responsáveis pelo meu interesse pela área da literatura, por ter sido um dos professores que despertou em mim a possibilidade de enxergar esse maravilhoso universo!

 

ET - Como e quando nasceu o primeiro livro?

Joaquim Eustáquio - Nos anos 90, houve um concurso de literatura em São Paulo. Então, resolvi escrever meu primeiro livro, para participar, “Um brasileiro na terra do Alá”, baseado nas minhas aventuras no exterior. Antes, havia escrito em manuscritos, uma história completa em formato de cordel denominada “Uma história do sertão”. Anos mais tarde, fiz um compilado também de meus poemas, dando o título para esse terceiro livro de “Momentos de uma vida comum”, título de um dos poemas que está no livro. E, atualmente, estou trabalhando no meu quarto livro que tem como título, “Memórias de um menino do Borá”. Inclusive, os meus três livros estão disponíveis no site da editora PerSe e podem ser adquiridos tanto no formato físico quanto em e-book.

 

ET - Falando em moleque do Borá, o livro retrata aqueles momentos idílicos de uma infância maravilhosa dos meninos que nadavam pelados no Garimpo, Voltinha, Chorão?

Joaquim Eustáquio - Também! O livro é um conjunto de memórias de minha infância e juventude em Sacramento, mostrando as dificuldades que foram enfrentadas na época: desde a perca de meu pai ainda muito novo, a adaptação depois da mudança da área rural para a cidade, as brincadeiras de rua que existiam na época, o contato com a natureza, nadando nos poços do Borá - que nessa época não tinha nenhuma poluição - e retratando também a divisão do tempo entre trabalhar e estudar, entre outras experiências vividas. Também é citado nele o “Bar do Lêdo” que era uma espécie de rodoviária de Sacramento naquela época.

 

ET - Você diz que estudou na Escola Coronel até a 7ª série... Como foi sua participação na vida estudantil da época, naqueles efervescentes anos 60?

Joaquim Eustáquio - Não cheguei a participar dessas instituições estudantis, como Grêmio Estudantil Aracy Pavanelli, União Estudantil Sacramentana (UES) ou outras entidades sociais, mas fui desenvolvendo meu gosto pela arte. Já durante meu período universitário, tive oportunidades de participar de vários eventos culturais: escrevendo, atuando, dirigindo e produzindo espetáculos teatrais. As peças geralmente eram comédias que utilizavam recursos como metalinguagem, sociolinguística, entre outros. Com essas apresentações, fui convidado para outras por causa de minha facilidade em interpretar os mais variados tipos de texto, indo do drama a comédia. Entre eles, um dos mais requisitados era o Cântico Negro, de José Régio. 

 

ET - Além de suas andanças pelas cercanias do Borá, do trabalho... qual era seu lazer preferido na cidade?

Joaquim Eustáquio - Meu lazer preferido em Sacramento naquela época era assistir aos filmes no Cine Capitólio, ficar andando em volta da praça da Matriz nos fins de semana e as brincadeiras dançantes que existiam nas casas e nas escolas. Já na juventude, pratiquei um pouco de boxe e musculação, quando morei em São Paulo, além de torcer para o Clube Atlético Mineiro desde menino.

 

ET - Isso não é lazer, é sofrimento!! Brincadeirinha!! (risos) Joaquim, agradecemos por esse papo gostoso. 

Joaquim Eustáquio - Eu é que agradeço o interesse pelo meu trabalho. Fico a disposição para qualquer esclarecimento. Grande abraço!