Jornal O Estado do Triângulo - Sacramento
Edição nº 1783- 18 de junho de 2021

Editorial

Nossa Decepção

Ivone Regina da Silva

Bertold Brecht já proclamava: "triste o país que precisa de heróis.
O Brasil ainda precisa deles, infelizmente, e não só na vitória. No meio de tantos ataques, defesas, fugas e caças às bruxas neste pós-Copa prematuro é preciso abandonar o close, sob o risco de ser arrastado pela turba emocionada.

E errar tão feio quanto o nosso futebol, não só dentro do campo como fora dele.
Ninguém gostou de como nos comportamos na Copa. Ninguém gostou da derrota para a França. Aliás, ninguém gostou de como perdemos para a França. Perdemos sem jogar. Perdemos sem lutar, como disse, surpreso, um jornalista francês em Munique.

Um treinador sem comando? Um time de estrelas sem garra? Um time de estrelas sem união? Jogadores milionários que se sentem tão auto-suficientes que negligenciam desafios?
Mas pior do que a derrota, que o brasileiro historicamente rejeita em qualquer circunstância, que os eventuais erros do Parreira, que a eventual ineficiência e displicência de alguns jogadores, são as atitudes.

O time saiu de campo contra a França desunido. Ignorou a torcida no estádio.
Deu as costas para o orgulho nacional. Se comportou como uma seleção privada.
Saiu pela porta dos fundos.

Nas entrevistas, alguns jogadores e dirigentes, ao mesmo tempo que evitavam falar de culpas e rejeitavam a caça às bruxas, atacaram os detratores, como se fossem todos.
Chegaram a insinuar que a torcida não tem opinião própria e é influenciada pela mídia, como se futebol fosse de domínio das letras.

A seleção é dispensada após o jogo. Volta para o Brasil quem quiser.
O que isso significa? Uns vão dar a cara para bater, outros não.
Encarar a torcida, agir como grupo, receber as críticas, admitir os erros ou pelo menos discuti-los, também.
A vida continua, como ela é, tanto no Brasil, como também no futebol.
Quando procuramos no dicionário a palavra decepção, encontramos desilusão, desengano.
Uma pessoa decepcionada, desiludida, pode alojar dentro de si feridas seríssimas, amarguras, tornando-a isolada, pois acaba tendo dificuldade de confiar novamente em alguém.
Onde estiver o ser humano haverá riscos de desilusão.

Talvez neste momento você esteja profundamente magoado e por causa disso se vê sem esperança, sem ânimo, sem vontade de perdoar.

Caros amigos, os heróis do país do futebol, somos nós que conseguimos com nosso suor a manutenção de nossas famílias; que enfrentamos filas e filas para obtermos uma consulta médica ou um remédio que não podemos comprar; herói é o pai que honradamente ganha o seu mísero salário e a mãe pesarosa que deixa o seu filhinho na creche para ir ao trabalho, cuidar de outras crianças que não são as suas; heróis são aqueles que mantém instituições beneficentes, que esperam ansiosos as verbas dos poderes públicos, que quase nunca vêm, para darem comida às crianças e idosos, enquanto os mensalões e tantas outras ajudas de custo, continuam sem punições.

Os Ronaldos, os Adrianos, os Cafus, Kakás e Parreiras, são apenas a projeção do sonho que todos acalentamos de sermos ricos, famosos e poderosos .
Heróis somos todos nós brasileiros !
E os jogadores,apenas uma grande decepção !

(*) Ivone Regina Silva é advogada e Conselheira Seccional da OAB/MG